Caçador de Boitatá

Toda vez que leio cordel

O coração quer a rima

Bate forte, um grau acima

Na saudade em tropel

Dos contos do menestrel.

Me lembro dos céus e climas

Juntos irmão, tios e primas,

Todos quase siderais

Ouvindo loas de pais

Viajamos auto-estimas.

Pai contava atento a tudo

No tempo que é tudo golpe

Trotava verso a galope

Altas noites vento mudo

Contava causos, sisudo,

Com a voz de tom profundo

Dizendo num só segundo:

- Juro que vi boitatá

Fogo de “amedrontá”

No além do mato fundo.

Só queimava chispante

Era uma bola de fogo

Erigida sem ter rogo

Do chão saia chispante

De pavor e de rompante

Vibrante nos perseguindo

Tropel a nos inquirindo

Zigue zagueando léu

Avermelhando o céu

Apavorando e fugindo.

Rápido no seu caminho

Cegaria num zás-trás

Sem nunca olhar prá trás

Ligeiro em desalinho

Alcancei os cedrinhos.

Saltei bem na dianteira

Minha mão na cartucheira

O tocaiei bem no ninho

Vigiei bem de mansinho

Luzindo na algibeira.

Era fogo da clareira

Descendo em direção

Dos meus olhos a visão

Da chama na corredeira

Do boitatá na zoeira.

O tiro certo eu mirei

Ele caiu eu o olhei

Nas águas do ribeirão

Apagando sem senão

Boitatá matreiro e fei’.

Agora nem tem mais não

Espanto e desatino

Era dom do meu destino

Ser ousado e valentão

Minhas mãos e o coração

Outras versões hão de ler

Se um pouco mais quer saber

Que o tempo descolore

Mas à luz desse folclore

Nada mais tenho a dizer.