A casa da Água Branca

A minha casa dos sonhos

Vem de uma inspiração

Dos meus tempos de criança

Presa na imaginação

E projetando moradas

Lembro o velho casarão

 

Foi-se o tempo, foi-se gentes

Foi-se até a velha figueira

Foi-se o parafuso da prensa

Foi-se a preta cozinheira

Só não foi a boa memória

Das caçadas de baladeira

 

As taipas resistem ao tempo

E ao vento ressequido

E o arrastado do chinelo

Não desmanchou o ladrilho

Da estrada, a velha paisagem

Nunca perdeu o seu brilho

 

O alpendre acalentou

Gente bem conversadeira

Se na rede balançou

Foi no torno de madeira

Bem fincados na parede

Guardou gibão e perneira

 

Aquele alpendre me vem

Como se fosse um altar

Destacado bem do chão

Parece querer se sagrar

Como algo imponente

Um Olimpo do lugar

 

Da mesinha da lateral

Lembro bem sua posição

O lugar do bom banquete

Ou para a degustação

De uma galinha caipira

Com farofa, arroz e feijão

 

Na fornalha de tijolo

Vejo o queijo borbulhar

E a raspa de rapadura

No esmalte a esperar

O queijo dançando mole

Para o sabor aguçar

 

O café enche a memória

Do olfato ao paladar

O grão torrado na hora

Faz a cheiro chafurdar

Lá de fora da cozinha

Lembro o moinho girar

 

Carne de boi se secava

Num suporte de madeira

Cada manta se espichava

Parecia uma esteira

Água fria era de pote

Não se tinha geladeira

 

O velho curral do lado

Já não amansa mais boi

E a casa de farinha

Já não é mais o que foi

Mas dão bem seu testemunho

Das tempos das pegas-de-boi

 

Da passagem da estrada

O velho casarão ainda resiste

Chama para sentir o lugar

Me olha, parece que insiste

Para recarregar de um afeto

Que a memória não desiste.