Reflexões de uma Mulher ou Depois da Tormenta

Reflexões de uma Mulher ou Depois da Tormenta

Estou fora da tormenta e prestes a entrar em outra : a tormenta de ver perdida minha privacidade e de a ter exposta. Pelo que sei da pequena cidade de Riocomprido vou sofrer em meio à burguesia mesquinha e medíocre que compõe a sociedade . Poucas pessoas escapam disto e têm maior alcance intelectual e afetivo, mas estes se espalham por aí, e tenho que pedir para a sorte me ajudar a encontrar alguns iluminados.

Em realidade , quando escrevi “Os Comilões “ eu me propus a narrar como , em geral, é o pessoal de Rio Comprido , por isto nunca pensei em publicar o Conto. Quem o ler com curiosidade e argúcia vai poder distinguir as características dos riocompridenses de tal forma, que não se faz necessário que eu os descreva.

Doravante vou esconder o que puder de minha vida pessoal principalmente os pesadelos que tenho pela noite. Estou sempre fechada e muito solitária em um quarto deste casarão.Nos meus sonhos quando não sou perseguida pelos carrascos do passado o serei

no presente. No último caso, os sonhos ficam reais e acordo e ponho me a caminhar meia dormida ,meia sonambúlica.

Preciso fechar sempre a janela e a porta da sala para que os estranhos não me espiem.Um fato como este que passei,em uma cidade pequena como Riocomprido se espalha rapidamente e é razão para comentários porém não quero falar ,comentar ou ouvir falsas palavras de consolo movidas pela curiosidade.

Minha boneca , Emília, parece ter se disfarçado de gente,e me olha com seus olhos azuis de pano arregalados,quase esbugalhados como se perguntasse:-E agora?

Creio que lhe dou vida para me sentir acompanhada ,para ter alguém solidária comigo,alguém que não profira palavras desnecessárias.Sinto me muda porque não quero falar e paralisada porque não quero relembrar o que se passou.

.Não sei quanto tempo vou ainda me esconder,evitar o passado.

Quando saio e as pessoas me olham sinto repugnância como se fosse um pedaço de carne a ser examinado no açougue. Acho que revivo o fato que passei com aqueles homens cruéis, penso que todos vão repetir suas brutalidades(seu estupro),e todos vão ser assim. Só este sentimento que me assola na rua é suficiente para me empurrar novamente para dentro de casa.

Não sei se uma parte minha ficou insana pelo choque que levei , mas sei que se seguir assim pela vida o futuro vai se apresentar tão ou mais sombrio que o passado , com ou sem os pequenos presentes que ganhei em tentativa de reparação.

O que me tem salvo é poder refletir e escrever.Novamente sento na cadeira e escrevo.Ah,se escrever pudesse anular a realidade porque passei!Que sonho!Que magia!

As palavras escorrem rápidas pelos dedos e se espalham no papel me proporcionando alívio como se fossem sedativos junto com a serenidade da minha inocência.Pego o papel rascunhado ainda,publico,e me sinto pronta para esquecer,porque uma situação destas que vivi só tem uma solução,enterrar no passado e não rememorar,fica numa página de papel largada sobre a escrivaninha.Eu?Vou viajar para outros campos...

Suzana Heemann

Suzana da Cunha Heemann
Enviado por Suzana da Cunha Heemann em 28/05/2008
Reeditado em 28/06/2008
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