Contentes da Vida

Contentes da Vida...

Elsa Balbão Pithan

Num domingo destes fui almoçar no restaurante do SESC em Cacupé. Lindo dia de sol e de brisa suave. Sentei num banquinho do quiosque de fronte ao portão do SESC e fiquei olhando o mar, o pescador de siris, uma canoa a motor com dois ocupantes de bermuda e camiseta cavada se afastar da costa. Iam cantando uma modinha nativa.

Sentia-me feliz. Agradeci a Deus minha juventude e minha autonomia aos 86 anos. O almoço esteve a meu gosto, muita salada, peixe, massas, bife... Comi bem e fui sentar à sombra dos canaviais que com a brisa balançando-os suspiravam preguiçosamente. Acho até que cochilei de faceira.

Às duas horas da tarde fui para o abrigo sentar-me e esperar o ônibus de volta. Faltava ainda uns 20mins. Três casais chegaram logo depois. Dois dos casais lá pelos seus 65 anos e o terceiro lá pelos 50. Conversavam alegres, contentes da vida. Prestei atenção na conversa. Um senhor barrigudinho dizia:

“Pois me operei mês passado de duas hérnias de disco e no princípio deste ano também operei um quisto seboso nas costas. O Doutor falou que nunca viu alguém se recuperar tão depressa como eu.”

Uma das senhoras então contou: “Comigo foi muito sério. Operei a vesícula, uma pedra grande, esverdeada. Mandei fazer um pendentif, oh! Podem olhar.” E mostrou a pedra que trazia numa linda corrente de ouro.

A outra senhora disse: “Meu caso foi único. Tive que operar um pólipo na garganta e fiquei sem poder falar por mais de quinze dias. Mas agora a garganta está nova em folha.”

O senhor mais moço, bem alegre, contou que extraíra um dente que estava encravado no osso. “Foi uma cirurgia delicada”, disse ele. “Quase três horas. Comi só mingau todo o mês passado. Hoje é a primeira refeição em que como carne.”

Eu olhando e escutando. Pensei –estão todos orgulhosos de suas doenças e eu não tenho nenhuma para me gabar. Nisto, um dos senhores (o mais moço deles) olhou-me e perguntou-me amigavelmente: “E a senhora? Que doença tem para nos contar?”

Eu não esperava a pergunta mas pensei ligeiro. Entristeci e disse: “Não sei. O Doutor pediu uma amostra do meu sangue e mandou-a para São Paulo.”

Ficaram todos sérios, de repente.

Mas eu não podia perder para eles, não é?