O Sol e o Vento

O sol e o vento vieram me chamar cedo. Bateram na janela e eu abri com o melhor dos sorrisos. Ultimo dia em Salvador. Dias de arte. Mar. Açaí. Amigos da época de faculdade. Cinco dias no sótão de um hotel antigo. Dias comigo mesma.

Mochila vai voltar mais pesada: livros de maracatu, cd de cordel, dvd de quilombolas, outros livros do xingu. Mais um cd das lavadeiras. Sem falar do canto dos sabiás. Do riso dos palhaços. Da simplicidade dos sambas de roda. A melancolia dos pífanos. Ebulição da cultura popular. Lembrança pros amigos, colar de semente amarela, saia rosa rodada.

Ontem encontrei um português que conversava com um indígena e chamou um negro africano. Fui convidada pra conversa e vi uma gameleira. Vi também esse mesmo africano abraçá-la, ajoelhar em seus pés e chorar. Permiti-me compartilhar do seu choro, pelos quilombolas calungas que também abraçam gameleiras.

Olhei pra ele: calça colorida, braço forte, sorriso de amigo. Olhei pra mim: saia florida, sandália de couro, cachos caídos no rosto. Gostei do que vi. Olhei ao redor e vi que outros também gostavam. Senti vontade de dançar. Sair pelo mundo a cantar. Cantar a vida, cantar a alegria da leveza.

Saí de Belo Horizonte. Esqueci o que alguém me disse. Lembrei de mim. Recordei das tranças que minha mãe fazia quando eu era criança. Deu vontade de ligar pra ela. Liguei. Olhei pra parede do bar, vi propagandas de cerveja. Olhei pra calçada, vi negras lindas com seus vestidos rendados. Vi baianas vendendo acarajé. Vi meninos que encantam com o sorriso amarelo. Sorriso da simplicidade.

Alguém me puxou pra dançar. Parece que adivinhou a vontade. Dancei. Saia rodada, rosto corado, sem pressa, sem saudade.

Ultimo dia em Salvador. Vestido lilás, biquíni azul, mergulho no mar.

O sol e o vento são amigos.

Aline Cântia
Enviado por Aline Cântia em 15/02/2006
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