FIM DAS LOIRAS

Outro dia meu filho Lucas me deu a seguinte noticia:

- Mãe eu li na net que as Loiras vão acabar.

- Nossa, como assim?

- Os cientistas dizem que geneticamente a loira natural, tipo de pai e mãe, sem mistura de raças, não vai nascer mais e.... – o celular toca e põe fim a explicação do garoto.

Ele se afasta animado com assuntos muito mais sérios que o fim das loiras e volto a escrever meu texto no blog.

Esse Lucas é uma graça – falo com meus botões e o teclado -, adora pesquisar na internet. Como sua paixão é o cinema, 90% do seu tempo é dedicado a vasculhar a vida e morte de atores, diretores, produtores, filmes premiados, gastos em produção e até quais os maiores prédios do Brasil e do mundo. O fato do maior prédio de São Paulo só ter 51 andares é algo que o consome, já que esse detalhe, segundo ele, impossibilita a filmagem do filme de ação que ele fará.

Bem, os outros 10% do tempo ele pesquisa de tudo inclusive esse fato relevante do fim das loiras.

Já tinha dado esse assunto por encerrado até que nesse final de semana resolvi retocar as raízes do meu cabelo no novo salão de beleza que inaugurou na minha rua.

Acordei cedo e fui uma das primeiras a entrar no salão.

A dona muito simpática foi logo me adiantando que só poderia me atender porque, por coincidência, uma cliente havia desmarcado o horário.

Agradecida, expliquei-lhe que só queria escurecer as raízes do meu cabelo e notei um certo ar de reprovação dela.

- Não prefere clarear?

- Não, nãoooooo.

- Um tom a menos, então? Um marrom?

- Não. Gosto dos meus cabelos preto mesmo.

- Sério – a cara de repulsa dela me fez olhar de novo para o espelho.

E ela acrescentou:

- Depois de uma "certa idade" o ideal é ir clareando os cabelos, quanto mais claro melhor.

Aquele pequeno detalhe na frase ficou martelando minha cabeça um bom tempo: “depois de uma certa idade”. Qual seria a idade que ela se referia?

Existe uma idade certa para se deixar de ser morena?

Será que o Lucas leu certo? São as loiras ou as morenas que estão em extinção?

- E aí? Vamos mudar de cor? Enquanto você pensa vou orientar as meninas do lavatório.

Ela se afasta e percebo que o salão já não está mais vazio, tem duas moças Loiras fazendo as unhas, outra Loira sentada no lavatório e, pasmem vocês, percebo que todas as funcionarias do salão são “descoloridas” indo do marrom ao loiro desespero.

Me sinto uma morena fora d’água.

- E aí, já pensou?

- Vou só escurecer as raízes mesmo – procuro dar um tom de convicção.

- Eu acho que você vai se arrepender – concluiu separando meus cabelos em quatro.

Pego uma revista super informativa e me afundo na cadeira bisbilhotando as intimidades dos artistas.

O processo não leva mais que 10 minutos. Ela pede que eu mude de lugar e aguarde de 30 a 40 minutos. Pego minha Quem e vou me misturar as Loiras.

Discretamente, observo uma aqui e outra ali e o entra e sai de mulheres no salão. Nenhuma morena.

Finalmente, termina o tempo e lavam meus cabelos. Volto para a cadeira em frente ao espelho e levo um susto. Meus cabelos estão tão negros que pareço uma assombração.

São meus cabelos ou já estou influenciada pelo meio?

Me sinto horrível.

- E ai, gostou?

- Ãhã – respondo entre lábios.

- Dá próxima, que tal tentar clarear um pouquinho?

- Pode ser.

Quase saio correndo.

Para me confortar vou falando pra mim mesma: “Acho o fim do mundo tanta mulher de cabeça clareada e as sobrancelhas escuras. Parecem taturanas.”

Cadê meus sais?

Etelvina de Oliveira
Enviado por Etelvina de Oliveira em 14/08/2008
Reeditado em 18/08/2008
Código do texto: T1127888
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