A URGÊNCIA DAS EMERGÊNCIAS...

Os primeiros raios de sol brincam com a cortina do meu quarto. Uma preguiça ferrenha cola-me à cama. Lembro de haver planejado caminhar, afastar o desconforto de imprevistos no final da semana. Nada melhor que o colírio da natureza, para refazer minha visão otimista.

Mais pareço uma borboleta entre as flores do caminho. Extasiada, contemplo as nuances do verde e, de narinas dilatadas, aspiro a essência matutina em todo seu esplendor. Audacioso, toca meu celular. Vai-se todo o encantamento incorporado. Preciso regressar. Minha filha necessita da emergência de um hospital.

Que mundo doente! Gigantesca e impaciente fila de sofredores aguarda a morosidade dos atendentes. Tento agilizar um daqueles entes letárgicos, ressaltando a urgência do meu caso. Um displicente rosto se ergue para me falar da preferência dos idosos. Meus olhos se voltam para as cabeças brancas presentes e não observam nenhum mal-estar. Justa preferência, porém tão mal utilizada! Ali se dizia emergência, porém, mais parecia um local de consultas...

Gritos de revolta se fazem ouvir. Reconheço a voz de minha filha. Sabe Deus aonde encontra forças para expor seu receio de desfalecer sem atendimento. E o milagre acontece! Médicos e enfermeiras surgem rápidos e solícitos. Em fração de segundos a conduziram a um dos disputados leitos. Exames, soro, medicações, tudo perfeito. Que fantástico!!!

Porém, o que não é, logo mostra sua cara. Duas horas à espera de um médico, cuja especialidade não é disponível naquele local.

Até que enfim a liberação! Minhas sobrancelhas se unem ante o preço das horas cobradas pelo estacionamento. No céu, as estrelas parecem sorrir de mais esta piada social.

Solto meu corpo na poltrona do carro e permito que meus lábios de abram num sorriso paradoxal. É o alívio de poder sentar o cansaço de horas e horas desconfortáveis.

Uma interrogação fustiga meu cérebro. Ora, ora, se com plano de saúde, ainda nos deixam órfãos do atendimento esperado, qual será o tamanho da provação de quem depende da saúde pública?

Até quando teremos de nos sentir felizes e conformados com o mínimo? Por quanto tempo permanecerá a humildade dos que se encontram aquém de nossa condição social? A resposta a essas perguntas baila no ar do descaso...

Ercy Fortes
Enviado por Ercy Fortes em 06/09/2008
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