O meu primeiro amor

Pelo título parece aquela velha canção dos Fevers, realmente tem algo a ver, vou divagar sobre a paixão platônica, um evento que, misteriosamente, ocorre em todos os adolescentes, e até em adultos meio emocionalmente desbitolados como eu. Não pesquisei a respeito, mas ao meu ver Paixão Platônica é uma paixão unilateral e que, de preferência, o objeto dela não tem conhecimento. Vitima colegas e amigos, mais especificamente naquele tipo rapaz cuja melhor amiga, e objeto da paixão, confidencia sobre seus fracassos amorosos e aventuras sexuais, o babaca escuta tudo, dá apoio moral e sonha que um dia, depois que ela transar com meio mundo e estiver um bagaço decadente, sobre algo para ele. Enfim, paixão platônica é uma projeção que fazemos do parceiro ideal e colocamos em alguém que conhecemos superficialmente.

Eu também, que infelizmente estou descobrindo que sou mais comum do que supunha minha vã filosofia, fui apaixonado por uma colega de sala de aula, é um segredo guardado a sete chaves dentro da minha mente doente. Acho que a conheci na sétima série, e meu coração foi fisgado quase instantaneamente. Outros colegas se abriam uns com os outros sobre seus amores, os que ousavam se declarar levavam um"vai plantar batatas", afinal naquela época o ficar já existia mas não era tão banal quanto agora. Eu ficava bem quietinho, nem para os colegas eu falava da minha paixão platônica, já pensou cair nos ouvidos dela e eu ter que plantar batatas? Não lido bem com rejeição, é de útero, não fui um bebê planejado e esperado, na verdade vim a furo de intrometido. Sempre fui meio tímido, minha altura era aquém da dos meus colegas da minha idade, até um baixinho da minha idade aqui da cidade era mais alto que eu na época, eu tinha um certo complexo, tudo ajudava para meu amor platônico continuar platônico. Sem falar ainda que a menina era da "High Society" e eu proletário, apenas me sobressaía pela minha facilidade em aprender e, claro, pela minha alma pura e imortal. Bom, como eu estava dizendo só eu sabia do meu "amor", sonhava que poderia ser correspondido, talvez a moça tivesse um desprendimento anormal, fosse um ser evoluído e me desse uma chance, então seria assim: uma menina bonita e rica que amaria um baixinho, feio, dentuço e pobre. Que garota de outro mundo!

Essa paixão durou aproximadamente dois anos, até que um dia uma professora fez uma pesquisa de opinião entre nós alunos, se era aceitável, se daria certo relações amorosas ou casamento entre pessoas de classes sociais diferentes. A maioria avassaladora dos alunos, inclusive eu, responderam que sim, claro, não tem nada a ver separar amor por classe social, não seria correto, não seria romântico. Claro que a resposta foi por já sermos pequenos hipócritas ou por acharmos que essa seria a resposta politicamente correta. Para minha surpresa a minha amada respondeu que cada um deveria achar seu par romântico entre sua patota, seu círculo social e argumentou alguma coisa que não consigo me lembrar, eu estava no instante catando pedaços do meu pobre coração. Acabou meu amor, perdi até o direito de sonhar com ela, nossos lindos filhos nunca existirão, não cheguei a odiá-la, mas reconheci a minha derrota e minha auto estima que já estava em baixa desceu ao porão. 

Não me lembro se fui colega dela no ano seguinte e não a vejo a muitos anos. Até hoje é segredo a minha primeira paixão platônica, tive outras mas não alimentei tanto quanto esta. Não chorei ou me descabelei como fazem muitos e, hoje, admiro a audácia daquela menina que aos quatorze anos não se rendeu à hipocrisia do não preconceito e teve a coragem de falar o que pensava, sem saber que naquele momento perderia o homem que a faria a mulher mais feliz do mundo, eu.

Marcos Boca Matos
Enviado por Marcos Boca Matos em 07/03/2006
Código do texto: T120007