Secretária Eletrônica

Tudo se resumia ao som da TV naquela sala, ele dormia profundamente, a luz, os sons, as cores era as mesmas que balançavam na tela da televisão e o fazia ficar adormecido há mais tempo. Ele não sonha há um bom tempo. Na TV as cores dançavam causando uma vertigem emocional. Na hora passava o filme do cine prive, uma história pornográfica policial do qual não se sabe qual gênio teve a idéia de misturar pornografia e filme policial.

“Eu sei que você está ai! Por que não aparece no trabalho? Faz uma semana que não te vejo aqui! Se você faltar de novo vai ser despedido!” A mensagem ecoava naquele lugar, sua secretária eletrônica era sua única amiga.

Algumas baratas andavam em pedaços de pizza perdidos por cima da mesa, é assustador saber que quando tudo chegar ao fim elas vão sobreviver e nós não... Quem é o insignificante? Ele está coberto com um cobertor até a altura do pescoço, ele dorme sentado, sua boca aberta e cheia de dentes compele com a luz que a TV está gerando.

Na pia do banheiro havia pasta de dente, escova de dente e uma lamina de barbear, a água pingava da torneira fazendo melodia na acústica daquele banheiro, acima da pilha havia um Box para guardar as coisas que estavam sob a pia, e havia um espelho do qual encarava Ele todas as manhãs. Já dizia Kafka que o acordar era a hora mais perigosa... Ele se sentia uma barata ao acordar.

Iria sobreviver a uma tragédia nuclear?

“Amor, sei que está ai! Por favor, responda, ligue para mim, eu te amo! Me desculpe por tudo!”

A sala de jantar daquela casa era completamente inútil! Tinha uma mesa grande com três cadeiras de cada lado e uma em cada cabeceira, havia dois jogos de pratos e vários talheres... Ele nunca comia em casa. A luz de tudo era meio fraca, transpirava tristeza no local, não sabe-se por que tudo que era construído por ele tinha este ar de tristeza...

A dança das cores continuava com os anúncios de comercial, o rádio-relógio denunciava a hora “3:00” e a madrugada caia a dentro. Todos os anúncios desta hora ficavam restritos aos tele-sex e aos anúncios de camisinha...

“Eu disse que talvez não fosse dar certo... Mas você sempre vai ser meu amigo, já te disse isto! Então, vamos sair na sexta? O que acha? Me ligue!”

A secretária eletrônica era sua única amiga, o seu cachorro estava enterrado no quintal e sua garrafa de uísque tinha secado sua ultima dose foi hoje. Ele sentia-se morrer a cada dia de sua vida, talvez está seja a maldição que Jesus soltou nos homens, sentir morrer a cada segundo... Ele não fumava, bebia um pouco, sorria, e brincava com suas piadinhas, fora funcionário do ano por três anos consecutivos e vendia mais carros que qualquer um. Ia se casar em novembro.

Os anúncios mostravam um belo lugar para passar a noite de núpcias.

“Tudo o que você sente, tudo que existe para você, tudo que você sangrou para conseguir construir vale alguma coisa? Um troféu de melhor funcionário não fará você sorrir mais... Me liga.”

Ele dormia cada vez mais profundamente, passou do estágio que ele podia acordar e a cada segundo ele não poderá acordar nunca mais. O frasco de remédios rola pelo chão da sala e o copo está vazio. Sua respiração diminui e sua cabeça tomba. Isso foi uma quatro da manha, por aí, isso foi o ultimo suspiro. Sua única amiga o viu morrer e a única coisa que ela disse foi:

“Oi! Aqui é da minha residência! Deixe um recado depois do BIP”