Meu cachorro nao!

Acompanhamos, eu e meus pais, bem de perto o processo de compra, reforma e mudança de uma pequena família pra uma casa na nossa rua, afinal, os donos dela seriam nossos vizinhos da frente.

Desde as visitas com o corretor, o trabalho dos pedreiros durante a reforma,tudo era feito com todos os membros da nova família presentes e com muita alegria.

Porém um detalhe, um dia, nos chamou a atenção. Esses acompanhamentos eram, na maioria das vezes, transformados em “festinhas”. Enquanto os pedreiros pegavam no pesado, os donos e os parentes estavam lá, sentados, num gostoso papo. O olhar atento sobre as obras, agregado ao convívio familiar, tornava a aquisição e reforma do bem um momento de enorme prazer para eles.

Não demorou muito e logo fomos conhecendo quem habitaria a nova casa. Com pouco tempo estavam à nossa porta se apresentando. Seriam eles, a esposa e seu segundo marido e uma filha ainda pequena, fruto do primeiro casamento dela, do qual era viúva.

Já nessa primeira apresentação,bastante informal, não tiveram a mínima cerimônia em pedir alguns copos, pratos e talheres.O lanche possuiam, mas o resto... Ah, pediram também o som, um desses aparelhos portáteis.Queriam deixar esses momentos bem alegres, descontraídos. Pediram, mas negamos,afinal em tempo de golpes mil, nunca se sabe!

Esse tão rápido interesse em conhecer a vizinhança, analisamos hoje,seria recheado de muitos interesses.

Os novos proprietários passaram a nos visitar constantemente pedindo mil e uma coisas que seriam de grande utilidade na obra.

Um problema na rede da água deles, nos obrigou a fornecer o líquido precioso por um bom tempo. Até aí tudo bem, já que uma mão lava a outra e quando estávamos construindo tivemos essa mesma ajuda de um outro bom vizinho.

Depois foi a vez das tradicionais ferramentas!Claro, essas não ficariam de fora (você já passou por isso, né?). Chaves de fenda e de boca, martelos, alicates e serrote , furadeira e carrinho de mão (esse ainda está lá), enfim, pediam tudo e até íamos emprestando de bom grado, mas já imaginando como seria a nossa vida depois que eles se mudassem em definitivo.

Com o passar do tempo e as obras já entrando no processo final, os encontros familiares iam se tornando mais freqüentes e animados, já que agora a moradia já possuía melhor estrutura.

Logicamente,a idéia de um churrasquinho básico não demorou a surgir. Mas, churrasco sem churrasqueira? Claro que não! O vizinho da frente empresta! E assistimos da nossa janela o dono e um ajudante de pedreiro atravessarem a rua , segurando cada um de um lado, aquela que nos fez falta uns bons três fins de semana.

Por incrível que pareça, acompanhávamos a obra com alegria também. Gostamos da cor escolhida para as paredes, parecia até que a casa era um pouco nossa!!!

Chegou afinal o dia da limpeza. Essa é a faxina que até a dona, por mais dondoca que seja, quer participar. Aparece toda eufórica, cumprimenta a todos dizendo que está quase chegando a hora, que aquela é a limpeza mais feliz de sua vida. Ai, ai...

Ao procurar os apetrechos para realizar a tal deliciosa faxina... Onde estão? Na casa da frente! E outra vez foram buscar, dessa vez, rodo e vassoura, deixando a promessa que na próxima vinda trariam outros, novinhos! Só me lembro de ver minha mãe lavando o pó de cimento desses objetos, um tanto mais desgastados que o normal,antes de iniciar a arrumação da casa no dia seguinte.

Fim das obras, casa limpa e mobiliada. Só os moradores não vieram.

Os novos vizinhos, depois de tantas preocupações envolvendo compra e reforma, resolveram viajar por alguns dias , descansar bastante antes de habitarem o novo lar.

Nossos problemas teriam chegado ao fim? Não, não tínhamos esperanças, afinal eles estariam ali, na nossa frente, dentre alguns dias e ficariam lá ,no mínimo, por alguns anos.Bem, pelo menos tomaríamos um fôlego nesse período da viagem.

E eis que assim, mergulhada nesse pensamento, ora de alívio, ora de dúvidas, ouço a campainha. Eram eles. Mais um pedido, o mais abusado e logicamente negado!

“Antes da mudança, vamos fazer uma viagem e como não conhecemos bem a vizinhança, estamos com receio de deixar a casa sozinha. Vocês poderiam então, nos emprestar o cachorro de vocês?”