Não brinque com o demônio

Amanhecia. Embora o Sol ainda não estivesse aparecido, os cinco rapazes dentro de uma barraca de nylon, que os protegia do vento e de provável chuva, acordavam com a pequena claridade.

Breve o Sol iluminaria o caminho que leva à Agulha do Diabo, uma montanha de escalada difícil que existe na Serra dos Órgãos, em Teresópolis, embora a base desta montanha esteja no município próximo de Magé.

O despertar numa montanha não tem nada em comum com outros lugares. A selva ou mesmo savana que cerca o lugar emite sons desconhecidos. Sons de pássaros da mata, o murmúrio eterno do riacho próximo, pois ninguém acampa longe da água, quando se pretende algo maior, como escalar uma montanha difícil.

A mata tem a sua magia, e como tem! Os cinco, já fora da barraca e feita a higiene matinal, estavam conferindo e retirando da barraca o material de assalto, necessário à escalada. Cordas, mosquetões os mais diversos, testando a fralda de segurança. Como manda a boa praxe, todos portavam facas de sobrevivência, lâmina longa. E o cheiro do café perfumava a mata, como se isto fosse necessário.

Refeição especial. Quem conhece, sabe! Bananas, com o seu potássio para evitar cãibras e desarranjos. Pelo menos duas, todos comiam. Pão integral com goiabada, que garantem a reserva de energias que vai ser queimada, com um gostoso, perfumado e revigorante café. Realmente, é um banquete completo para quem desenvolve este tipo de atividade.

Após o café, a picada que conduz até a Agulha do Diabo. Para os que estão acampados perto do cume da Pedra do Sino, o percurso leva pouco mais de meia hora, ou até menos. Mochila com todos os apetrechos, inclusive bastante água, queijos, pães, ovos cozidos e lingüiça de frango ou mesmo a natural, fazem parte da munição de boca que levam obrigatoriamente, sem falar no chá, onde a cafeína restaura forças alquebradas, ainda que de jovens.

Escalar montanhas é uma arte. Mesmo com toda a segurança que existe, um acidente não pode ser descartado. Todo o cuidado e respeito ao desafio, devem ser observados, pena de um acidente.

Quando se chega na Agulha, nada se leva senão cordas de nylon e mosquetões, a atual “fralda” de segurança e o mosquetão em oito, que permite um rapel seguro.

O mosquetão em oito nada mais é do que uma peça em alumínio que tem a propriedade de colocar a corda num orifício e sair pelo outro, com uma trave entre ambos, o que permite ao montanhista descer em segurança longos trechos.

Almério, um dos participantes, e bastante desconhecido de todos, esbraveja valentia.

- Agulha do Diabo por quê?

- A escada é perigosa. Deram este nome – explicou um experimentado guia.

- E desde quando o demônio tem algo a ver com escaladas?

- Não sei. Mas se deram este nome, razão não falta.

A breve discussão não prosseguiu. É comum, na escalada deste pico, não ser feito a tradicional cordada, onde os participantes ficam unidos entre si.

A escalada é feita sozinho, e o cume da Agulha não suporta mais do que quatro pessoas.

Almério, cujo corpo não foi até hoje encontrado, estragou o chá e a polenta de lingüiça, comida por todos após a descida...

Jorge Cortás Sader Filho
Enviado por Jorge Cortás Sader Filho em 06/10/2008
Reeditado em 07/10/2008
Código do texto: T1214133
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