CRONICA SOBRE UM LIVRO

Uma crônica sobre um livro, pode até ser assim como chover no molhado. Sobre livros já se escreveu de tudo. Até livros.

Mas esta é sobre um livro específico, escrito pelo meu amigo Antonio Maria, aqui do Recanto, e tem, como todos os trabalhos escritos pelos amigos, aquele apelo especial de ser algo em que temos muito carinho, e muito empenho em que dê certo.

Mas tem muito mais do que isso, também. Tem fluidez, ritmo de escrita, e o Antonio consegue manter-se confortavelmente, o tempo todo, na posição de quem não apenas conta, mas de quem se conta. E isso, contar-se, é infinitamente mais difícil.

O livro que contém, por um lado, uma história de redenção e fim feliz, por outro não deixa de conter em si todas as agruras de um percurso psicológico extremamente sofrido, que o autor revela manuseando-o com o mais elegante de todos os recursos literários: a simplicidade.

Com essa simplicidade, essa coisa tão difícil de atingir, o Antônio não deixa de se lamentar por todos os inconvenientes desse percurso, causados a si e aos outros, e até de imprimir á narrativa um certo tom de justificativa, nada escondendo e de nada se eximindo.

Mas faz bem mais, e expõe-se duma forma que acaba sendo didática, acreditando que haverá quem se identifique com a sua história e colha nas suas palavras uma partícula de esperança: - a de que é possível libertar-se da nefasta dependência química.

Admiro e louvo a sua coragem, e esse propósito firme de ajudar pelo exemplo. E não consigo deixar de me lembrar de um pouco de um filme que vi há muitos anos, e que me marcou por uma cena de extrema sensibilidade que se passava entre o personagem principal ( Arthur ) e alguém que, por amor, procurava ver nas suas crises de alcoolismo meras excentricidades.

Arrastando as palavras, de olho brilhante, Arthur dizia alguma coisa como:

“- Não procures desculpas para mim. Não há desculpas, nem há nada de poético nisto. Nem todos os que bebem são poetas... Alguns de nós até bebem precisamente por causa disso !...”

O tempo foi passando, mas nunca esqueci estas palavras de aparente simplicidade.

No seu caso, Antonio, é muito óbvio que não era a falta de talento, e muito menos de poesia, que o levava a beber. Mas é assim o fado, o destino dos homens: -prevalece acima de qualquer lógica, e exige ser cumprido acima de qualquer benção ou sofrimento.

Nesse contexto, é um privilégio que alguém possa ter por destino vivenciar os dois lados de uma mesma vida, e ainda sobrar de si o suficiente para – com tanto talento e desapego - contar a sua história.

Possa ela ser útil a muitos, Antonio, e realizar assim o seu desejo. Um enorme abraço.

Henrique Mendes
Enviado por Henrique Mendes em 10/10/2008
Código do texto: T1221215
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