Meio (1/2) Ambiente.

MEIO (1/2) AMBIENTE

Vou com a minha neta a uma padaria, numa manhã esplêndida de domingo, quando a pego soletrando umas palavras em cartaz no mural:

- me-io am-bien-te... Vô! o que é isso? Meio ambiente?

- Garota! Vou explicar primeiro o que é ambiente, tá? Falo para ganhar tempo e achar as palavras para uma criança que mal se iniciou no mundo das letras.

- Ambiente tem a ver com o lugar em que estamos e vivemos, por exemplo: o ambiente desta padaria, é este local aqui, onde estamos, e lá dentro onde os padeiros fazem os pães; na sua escola é o ambiente escolar, na nossa rua é o ambiente em que vivemos com os nossos vizinhos. Entendeu?

- Sim, vô! Diz, apressada e com os olhos arregalados e boca lambuzada de sorvete.

- E meio...

- Ah vô! Isso eu sei... é o que temos que dividir com os outros, não é? Toda vez que ganho alguma coisa do senhor, a mamãe diz dá meio para seu irmão... Então, meio ambiente é o local que vivemos e dividimos com os outros, não é?

Fico surpreso com a sabedoria em tenra idade.

- É isso mesmo minha garota, meio ambiente é o local em que vivemos, e dividimos com outros seres, humanos, animais, vegetais e minerais também...

- Que isso vô !? Agora não entendi mais nada... mineral e vegetal não vivem, vivem?

- Sim, garota, e para termos um bom meio ambiente temos que respeitar cada um desses seres.

Com auxílio da minha neta começo a ampliar o meu conceito de meio ambiente. Da padaria podemos estender este conceito para esta nave azul em que vivemos e convivemos, tão particular, pois não há provas inequívocas de vida em outros planetas. Além de ampliar, temos que modernizar o conceito de preservação do “meio ambiente”. Será que é deixar a natureza virgem como foi criada? Ou explorarmos seus recursos com respeito aos conviventes? As tribos, com pouco contato com a civilização, devem continuar com seus “modus vivendi"? Assistindo a um debate na TV, com os irmãos Generais Figueiredo, que serviram na região amazônica, os ouvi relatar o episódio ocorrido com um professor índio, que, em certa ocasião, palestrava no sentido de que a sua gente tem o direito de evoluir e foi contestado por uma antropóloga. Ele, já acostumado a essas contestações, uma vez que há os que defendem posição contrária, preparou-se para justificar a sua: mostrou um jaqui (tipo de jacá que os índios carregam nas costas) com mais ou menos quarenta quilos de lenha e pediu para a antropóloga carregá-lo de um lado para outro... o que ela não fez. Diante do insucesso, o professor índio falou:

- A minha mãe carregou isto a vida toda; hoje tem a coluna comprometida. Não quero isto para as minhas filhas, queremos que isto vire peça de museu.

Recordo-me também de um cronista que falava da beleza romantizada da vida do índio, até que sentiu uma dor de dente e aí pensou:

-Se eu fosse índio, como resolveria isto?

Hoje exportamos recursos minerais e vegetais sem nenhuma tributação, o bem que é de todos vai para o exterior. E vai sem beneficiamento, pois os compradores não os querem beneficiados, pois preferem que os empregos gerados para isto sejam gerados lá. A sociedade brasileira fica com o quê? Matas devastadas, rios poluídos e assoreados, poluição do ar, águas e peixes cheios de mercúrio.

Quem ganha e quem perde?

Ganham alguns poucos exploradores e seus coniventes.

Perde toda a humanidade, a sociedade brasileira e os povos da floresta, que ficam sem os seus recursos e meios de sobrevivência, mas que poderiam ter uma vida mais digna com uma exploração sustentável da floresta. Hoje já temos regiões devastadas na Amazônia que poderiam ser reflorestadas, com seringais, castanhais, plantações cacau.

Sugiro uma tributação destes bens de exportação, um lobby com os países exportadores de recursos primários para que, parte do beneficiamento, seja feito na origem, ou então quanto mais primário, mais tributado, com a finalidade de que a receita tributária seja para fiscalizar e aplicar na recuperação destas áreas de exploração.

Não estou inovando, já foi assim no Brasil: antes da Lei Kandir de 1996, os bens primários para exportação eram tributados; hoje, não mais. Alguns países, como a Rússia, Índia, já estão tributando com esta finalidade. Preservar e fiscalizar o meio ambiente. Seria o imposto verde.

Quero que esta neta, com quem convivo, converso e aprendo, mas que ainda não nasceu, possa ver as florestas amazônicas como eu um dia vi.

Então é isto... E se eu ganhar algum prêmio, vou ter que dividir ao meio (1/2) com a minha neta que está por vir.

Defranco
Enviado por Defranco em 04/11/2008
Reeditado em 16/07/2014
Código do texto: T1264950
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