Série "Ditados na berlinda" 12: Quem não arrisca, não petisca?

Numa visita extremamente gratificante à página da excelente Miriam Olivera, após me deliciar com sua crônica-resenha “A Viagem do Elefante”, soube que o autor José Saramago, Nobel de Literatura de 1998, estaria em São Paulo na noite da quinta feira seguinte, ou seja, em exatamente uma semana, autografando justamente o livro sobre o qual a Miriam havia escrito. Imediatamente, após agradecê-la pela preciosa dica, fui me informar onde seria o evento.

Pela internet descobri que a noite de autógrafos seria no SESC Pinheiros, perto de minha casa (em se tratando de São Paulo). E descobri também que seriam distribuídos ingressos gratuitos para o evento a partir das dez horas da manhã da sexta feira, o dia seguinte às minhas descobertas. Feliz e quase incrédula com a possibilidade concreta de apertar a mão do autor do maravilhoso “O Ano da Morte de Ricardo Reis” - que já li três vezes - e de obter seu livro novo enfeitado com seu cobiçado autógrafo, resolvi arriscar e ajustei minha agenda para passar no SESC Pinheiros exatamente às dez da manhã do dia seguinte, para garantir meus dois ingressos. Quem levaria comigo era um detalhe no qual pensaria depois, mas tinha certeza de que não faltariam candidatos.

Sexta feira, dez horas, ligeiramente atrasada. Peguei meu carro e rumei para Pinheiros, empolgada e ansiosa. O que não contava é com a reforma das calçadas da região. Um trânsito ainda mais infernal, ainda mais incomum, me fez levar meia hora para chegar ao local, ao invés dos dez minutos que levaria caso São Paulo estivesse de bom humor. Assim que apontei com a frente do carro no estacionamento do SESC, lembrei-me, estarrecida, que não tinha nenhum dinheiro em minha inutilmente enorme bolsa... portanto, não teria os cinco reais para pagar o estacionamento na saída!

Mais uma vez amaldiçoei minha natureza absolutamente desligada das questões práticas. Cinco reais! Nem juntando as moedinhas espalhadas pela bolsa. A alternativa era parar na rua mesmo, e assim dei meia volta e fui buscar meu lugar ao sol. E que sol! Iria assar como frango de padaria na volta, mas não me incomodei. E nem me importei com o terrorismo que meus amigos fazem sobre os perigos de se estacionar o carro na rua, ainda mais na região de Pinheiros: meu caro tem seguro, se o levassem eu conseguiria outro. Mas ingresso para apertar a mão do Saramago, não.

Meia hora depois (trânsito infernal para sair da rua Paes Leme, interdição de parte da rua Fernão Dias, caminhões invadindo o bairro, nenhuma vaga próxima...), ou seja, às 11 horas da manhã, consegui uma vaga a cerca de 800 metros do meu destino. Caminhando contra o vento, sem lenço e sem dinheiro - mas feliz -, finalmente subi as escadas do moderno edifício do SESC Pinheiros.

Para constatar, por meio de um cartaz escrito à mão, que os ingressos para a noite de autógrafos de José Saramago estavam esgotados. Dois homens conversavam com o atendente, cujo diálogo peguei no meio:

- A fila às dez horas virava o quarteirão...

- Mas os ingressos não seriam distribuídos apenas nesta unidade?

- Não, nas outras unidades também.

Intrometi-me:

- Esgotados, então?

- Sim, respondeu-me o atendente. Os ingressos se esgotaram em três minutos.

Três minutos! E eu, mais de uma hora depois, ainda acreditando...

Confesso que minha decepção não foi imensa, pois bem lá no fundo, em algum momento, achei mesmo que estar frente a frente com José Saramago era muita areia para meu caminhãozinho. Muita árvore para meu vasinho. Uma lista telefônica inteira para minha agendinha de bolso.

Arrisquei, mas não petisquei. Porém a viagem não foi inteiramente perdida: à saída, ganhei uma amostra grátis de cera depilatória. Já tenho o que fazer na próxima quinta feira à noite!