Onde se aprende isso?

Ela estava no passeio. Escorava-se na sombrinha que deveria protegê-la do sol. Apesar do calor, usava lenço na cabeça, saia quase ao tornozelo e uma blusa florida de mangas compridas. Estava debruçada sobre si mesma. Sinal de que o tempo pesava sobre seus fracos ombros e pernas. O olhar, porém, era vivo. Buscava no horizonte o número do ônibus que a levaria para seu lar. Estava faminta. Saíra de sua casa às quatro horas da madrugada a fim de conseguir data para uma consulta. Precisava controlar melhor o diabetes. Era urgente consultar um especialista. Depois de cinco horas na fila, conseguiu uma consulta para cinco meses adiante. Após todo esse sacrifício, foi receber sua aposentadoria. Havia uma fila especialmente para idosos. Porém, todos foram receber naquele mesmo dia, naquele mesmo banco, naquela mesma hora. Várias vezes teve de se escorar na parede e, assim, conseguir manter-se de pé. Depois de tudo isso, estava ali no ponto de ônibus. Três já haviam passado sem atender aos seus insistentes sinais. Por fim, já na hora em que estudantes estavam indo para casa, um coletivo parou; não para ela, mas para eles.

Os colegiais, muito ágeis, correram para o ônibus. Empurravam-se e gritavam como fossem gente totalmente órfã. Alguns adultos deram lugar à legião. À medida que entravam, ocupavam as cadeiras vazias na parte de trás do veículo. Um dos adultos manteve-se à porta. Essa atitude obrigou o motorista a esperá-la. Tão logo a velhinha se aproximou, o homem saltou para dentro e garantiu um assento. Ela entrou com um esforço enorme. Sem ajuda. Observou que os lugares destinados aos idosos e outras pessoas especiais estavam ocupados por rapazes. Gentilmente, ela disse ao que estava mais próximo dela:

- Há lugar lá atrás... Ao que o rapaz respondeu:

- Vá cagar, sua velha folgada!!! Sem perceber, talvez devido ao dia

extenuante, a velhinha deu um tapinha no boné da criatura. A reação foi terrível!

Ainda sentado, com um chute atingiu a barriga da velha senhora. Ela se dobrou e bateu a cabeça na quina do banco. Um fio de sangue desceu da testa, imediatamente. A fera, em seguida, com os punhos fechados, atingiu o rosto da vítima. Ela caiu. A besta segurou nas barras do teto do ônibus, levantou seu corpo e deixou-se cair sobre as costelas da velhinha. Aprumou-se rapidamente e desferiu chutes por todo o corpo da anciã. Em meio aos gritos dos passageiros e à imobilidade total do motorista, o agressor fugiu.

Os passageiros estavam indóceis. Pressionavam o motorista para seguir viagem. A velha senhora conseguiu levantar-se. Ensangüentada. Estava para ser deixada na rua quando surgiu um agente de polícia. Pacientemente, o policial explicou que ela deveria se cuidar enquanto ele chamaria uma viatura para registrar a ocorrência e tentar achar o monstro. Revoltados, os passageiros, em uníssono, soltaram uma grande vaia.

Benedito de Castro 12/11/2006