Meu dentista, o produtor de leite e a amante!
(escrita em 2005, mas ainda atual!)
Não. Meu dentista não tem amante. Uma família fenomenal. A mulher, uma senhora e tanto, dá gosto ver. Uma filha de fazer inveja. O filho então. Ouvi um zum zum que seu pai vai ser vovô.
O seu negócio são umas idéias esquisitas, teorias mirabolantes à respeito da vida.
Imagina você. Ele é produtor de leite. Não é “tirador”, é produtor de leite. Tem diferença, sim senhor!
“Tirador” de leite você conhece de longe: Chapéu roto na cabeça, calça limpinha de tão velha! Botina rancheira do ano passado. Rosto “encorreado”, não de anos vividos, mas tantas madrugadas insones. As mãos parecem luvas de couro; não curtido, couro tratado ao relento. O riso, maravilhoso: faltam um canino, um molar, um pré-molar, o décimo quinto, um não sei o quê. Os do “juízo” perdeu, nem lembra mais. Também, para quê tantos dentes!
O “tirador” de leite tem esposa e cinco filhos. Os filhos: dois, de madrugada, pegam a perua da prefeitura e vão para a escola; uma casou com o Xico do seu Neném, aquele que tem 3 alqueires na Furna Grande; o mais velho está arranjado com o Dr. Adilson. Resta o “Coisinha”; não sei o que é feito dele. Dizem que anda por aí.
A mulher, criatura encantadora! Nos terços de Santa Luzia é a mais fervorosa. Se houver Paraíso, ela é “hours-concours”. Dá gosto vê-la fazer polvilho. O suor pingando à beira das tachas de farinha. O ritmado do batedouro de roupas, faz inveja a bateria de escola de samba. E à noite, então, quando se passa pela sua porta, cá da estrada, dá para ver estrelinhas cintilantes, é o ferro de brasas, alisando balaios de chitas. Santa economista! É uma beleza de mulher.
Seu plantel, 20 mestiças. As melhores. Dão, bem batido, 2 litros e meio! É uma fartura!
Entre os bens mais queridos do “tirador” de leite está o Corcel I, pneus riscados, a porta do passageiro amarrada de “sedem”, o porta malas com arame de “ferpa”. Não é branco, não é amarelo, não é vermelho, mas o trás quinzenalmente à cooperativa para acertar as contas. Quem precisa de luxos!
No caminho acena a torto e a direito.
- Toma tento home! Aquilo não é gente. É o fila do dr. Adilson!.
Na porta da cooperativa, que felicidade!
No escritório, então, que aflição!
- Quanto ? isto tudo ? Virgem Santa! Mês que vem eu acerto!
Enquanto risca fogo no possante, encosta, trigueiro, em nosso amigo “tirador” de leite, a Mitsubishi do Dr. Dicão. Preta, acessórios cromados, 2006.
- 2006 ?.
É, já estamos no final do ano! Que alegria! O doutor é tão popular!
Não. O dr. Dicão não tira nem produz leite. Dizem que até deixou de beber. Ele cria zebu e tem amante.
- O que tem uma coisa a ver com a outra ?
O meu dentista quer porque quer seguir o exemplo do dr. Dicão.
Contam que, tempos atrás, o Dr. Dicão era produtor de leite. Plantel elite. 40 quilos dia. Ordenha, tanque de expansão. Um brinco! E quinzenalmente discussão no escritório. Mudou de laticínio umas mil vezes. Um belo dia, conversando com o Romeu... É, lá das bandas do Matão ... recebeu o conselho fatídico:
- Dicão meu amigo, você já fez as contas do tanto que você gasta com suas vacas ?
- Dicão, meu caro, o que as suas vacas dão em troca ?
- Atenção?
- Não.
- Carinho ?
- Não.
- Compreensão ?
- Não.
- Dinheiro ?
- Não.
- Carícias?
- Não.
- Meu doutor Dicão, o que essas vacas dão então ?
- Despesas, contrariedades, insônia, depressão. Stress, mau humor, solidão.
- Então, doutor, arrume uma amante! A despesa não é tanta, a atenção esbanja, o carinho encanta, ah! Quanta compreensão. As carícias, então! Sobra tempo, atrai amizade, negociata, a coragem aumenta. Até a esposa espanta! Deixa a sofreguidão!
Não deu outra. O doutor Dicão despachou o plantel leiteiro. Num arranjo com o Angico iniciou só couro branco. Tudo mocho, por causa de cisma atoa! Pôs por conta, não uma, mas duas “galegas” , mais de metro e meio de mulher, defeito nenhum!
Não faz muito tempo. Ei-lo ali, ao lado do nosso amigo “tirador” de leite, risonho, folgaz, rico ...
O meu dentista já decidiu, vai seguir o exemplo do doutor Dicão.
Só tem um problema...
A sua secretaria não aceita!
João dos Santos Leite
Ituiutaba – MG, 14 de julho de 2005