15 ARCAÍSMOS

Pode ser besteira muita, de minha parte, mas me confesso com certo pendor para os "arcaísmos". É; sem motivo plausível, tenho um caimento por eles. E não apenas o digo em razão de o João dos Guimarães Rosa, com genialidade, haver ressuscitado um montão deles e os transformado em "neologismos". Ora, como todos sabem, é arcaica toda aquela palavra, ou termo, e locução que envelheceram no tempo, ao longo de gerações e gerações, às vezes até atravessando séculos, assumindo foros de linguagem velha, superada, fora de série.

As "gírias", que são modismos, em geral tendem a envelhecer precocemente, o que é uma pena. Claro que algumas se fixam, entrelaçando-se no linguajar que falamos e não têm remédio de largaram dos sambódromos da linguagem.

Falo por mim: besteira muita ou não, prefiro algo assim, em linguagem antiga, lá dos tempos do onça, ao bobo uso exagerado dos "estrangeirismos". Mas vejam bem: não é para ser pedante, não. Aprecio os arcaísmos, e fim. Eles não são legais?

Quando ainda bem verde, à moda camoniana, eu dava dez para me enxerir para alguma cabrita e largar língua assim: – Você é uma rapariga muito “fermosa”! Às vezes, errava a mão e também dizia “fremosa”. A cabocla se ria e não falava nada. Agora, vejam, sem mais misturar alhos com bugalhos, olhem só alguns arcaísmos, colhidos alhures, que fui botando numa folha; uns estão sob a forma de termos, outros, enfeixados em expressões:

a seu bel-prazer – por vontade própria: ele faz poemas a seu bel- prazer.

aprazer – causar prazer; deleitar: esse jogo apraz ao torcedor.

arquiduque - título honorífico dos príncipes da antiga família reinante da Áustria [ver no “Aurélio”], superior ao título de visconde.

botica – loja de mercadorias; farmácia: Lia foi à botica com o Lineu.

cáiser – imperador, na Alemanha.

calaça – costela de porco, ou certa porção de carne do mesmo animal.

camisa-de-vênus – preservativo; camisinha.

ceroula(s) – peça de vestuário que cobre o ventre, as coxas e as pernas, e é usada (hoje raramente) pelos homens por baixo das calcas (idem); em versão moderna, a cueca.

czar – soberano da Rússia.

deputado – adj. – destinado; consignado: Fernanda é deputada poetisa alencarina.

drudo – indivíduo amancebado: quando jovem, eu era drudo com as musas.

empeço \ ê \ – empecilho; obstáculo: não ponha empeço, vou casar com Maria.

entendudo – entendido; perito; erudito: Kathleen é entenduda em teoria literária.

faroleiro – indivíduo encarregado de um farol (idem); profissional que trabalhava cuidando de um farol.

galego – qualquer estrangeiro, ainda que da Cochinchina.

luita – luta: cabra da peste do Ceará vai sempre à luita.

parcir – poupar: com sua mercê, mano velho, vou parcir minhas palavras com a sua ignorância.

saber de cor – com fundamento ou base na memória; de memória (idem); de coração, muito antigamente: Edir sabe de cor tudo sobre os índios.

senzala – conjunto de casas ou alojamentos que se destinavam aos escravos de uma fazenda ou de uma casa senhorial (idem).

tamanco – calçado grosseiro, cuja base é de madeira e não de sola (idem).

Aí, supra, está apenas uma amostrinha do que são os arcaísmos. Vocês todos, sem exceção, e eu também, de um modo ou de outro, utilizamos essa coisica démodé, chamada de arcaísmo e que os linguistas e a memória histórica do idioma luso, sem pena, botam na lata do lixo do nosso léxico. E, então, pois, pois... Não é que até as palavras e os linguajares da gente envelhecem?!

Senhor rei mandou dizer que vocês engordem aí a minha pobre e magra lista. Senão os coitados, aqui ventilados, nestas mal traçadas, vão perecer de vez na jornada dos tempos.

Em contrapartida, para competir com esses camaradas que vimos hoje, quem sabe, ainda voltarei a atacar os neologismos, que os estrangeirismos eu os coloco, desde já, no final da fila.

Fort., 18/01/2009.

Gomes da Silveira
Enviado por Gomes da Silveira em 18/01/2009
Reeditado em 02/03/2010
Código do texto: T1390777
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