Comunicar

Ontem vivi mais um daqueles episódios delirantes e inesperados e vice-versa. Não liguem, ando com as ideias baralhadas mesmo.

Entrei num sítio, não importa qual nem o que ia fazer, mas aviso que não foi numa igreja. Entrei, como dizia, e mal a porta se abre ia quase esbarrando com uma imagem de Nossa Senhora de Fátima. Dado o insólito, reagi pavlovianamente, benzendo-me! Depois olhei para a assistência posicionada perante Nossa Senhora, os dois padres, algumas senhoras desconhecidas e tomei o meu lugar junto a uma colega e amiga (gosto dela! Somos tão diferentes e, no entanto, é com ela que me entendo. Deixa-me bater na madeira.). Numa espiral imparável de ridículo, assim que fiquei de frente para os senhores padres e o altar improvisado, tornei a benzer-me! Apanhei a cerimónia já a meio, pelo que me limitei a estar. Estava então a fazer-se a leitura de várias orações, leitura essa feita directamente de um livrinho. Eu não tinha livrinho, não sabia as orações, fiquei calada. Um dos senhores padres queria que se fizessem pausas em certas partes e ia com a mão estendida marcando o ritmo. A desafinação era palpável, mas a oração continuava. Fixei-me nas palavras, e só nelas. Eram de louvor a Nossa Senhora. O que significavam? Louvor...! Qual o significado daqueles homens, daquelas mulheres, as conhecidas e as desconhecidas, dos dois padres, as velas acesas, o andor de Nossa Senhora, as flores, que não decifrei se eram artificiais, reunidas todas naquele espaço? A solidariedade, a fraternidade, claro! O significado era o melhor. Não duvido. Mas tudo APENAS simbólico. Porquê? Porque não houve naquela assembleia uma palavra pessoal, HUMANA, dita de improviso, boa ou má, educada ou rude, vinda do coração ou do cérebro, dita com amor ou com raiva. Nada! Orações e cânticos, cânticos e orações. Fórmulas! Como se nada tivesse sido dito.

Assim somos. Ou não temos nada para dizer, ou não sabemos dizer, ou não queremos dizer, ou dizemos o que achamos que é expressão da fineza do nosso espírito, estilo: eu não falo do quotidiano, da vidinha, eu falo de IDEIAS! Oh meu Deus como eu sou fino! Oh, não! Fui eu que disse isto? Sou tããããoooo inteligente! Entretanto, em redor, aqueles que ouvem dormem ou desejam dormir, ou contêm, a custo, o riso. Tal e qual ontem, nós, quase todos, postos em conjunto em redor do andor de Nossa Senhora. Esta, felizmente, sabiamente calada!