Passarinho
Hoje minha mãe veio me ver, mesmo eu pedindo para que não viesse aqui,
Minha velhinha traz frutas, bolo, guaraná, cigarro, pasta de dente e sabonete,
Quando olho para ela, vejo o que o mundo fez com sua face, com sua expressão,
As mãos ásperas, a voz cansada, mas continua com aquele brilho nos olhos, como dez anos atrás,
Mãe solteira que cuidou bem de mim e do meu velho irmão,
E hoje, olha o presente que eu dei pra ela: vir me visitar no X, pegando fila, sujeita a ser corrida por duas mãos,
Lembro de minha infância, pequeno, e os carrões chegando com trouxas e trouxas de roupas caras e sujas,
Minha mãe no tanque de cimento, sabão de soda, sabão em pó, batendo roupa, quarando os lençóis de cetim no varal, de sentinela, para que não roubassem a roupa lavada, seu ganha pão,
As mãos dela descascavam, o couro caía, e ela coava o café, comprava o pão, passava manteiga para mim,
Pedia fiado, comprava o feijão, quando não tinha óleo, pedia e ganhava um pedaço de banha no açougue, e eu cresci assim: sendo criado na gordura de porco!!!
Sem luxo, sem brinquedo, sem histórias, descalço; livre, porém vigiado,
As minhas asas cresceram junto com a minha ambição, e no dia em que resolvi voar sozinho, me pegaram e me puseram na gaiola.
Não deixo a peteca cair, mas também não tenho vergonha de dizer, que me dá vontade de chorar, quando vejo minha mãe ter de vir me visitar...