Passarinho

Hoje minha mãe veio me ver, mesmo eu pedindo para que não viesse aqui,

Minha velhinha traz frutas, bolo, guaraná, cigarro, pasta de dente e sabonete,

Quando olho para ela, vejo o que o mundo fez com sua face, com sua expressão,

As mãos ásperas, a voz cansada, mas continua com aquele brilho nos olhos, como dez anos atrás,

Mãe solteira que cuidou bem de mim e do meu velho irmão,

E hoje, olha o presente que eu dei pra ela: vir me visitar no X, pegando fila, sujeita a ser corrida por duas mãos,

Lembro de minha infância, pequeno, e os carrões chegando com trouxas e trouxas de roupas caras e sujas,

Minha mãe no tanque de cimento, sabão de soda, sabão em pó, batendo roupa, quarando os lençóis de cetim no varal, de sentinela, para que não roubassem a roupa lavada, seu ganha pão,

As mãos dela descascavam, o couro caía, e ela coava o café, comprava o pão, passava manteiga para mim,

Pedia fiado, comprava o feijão, quando não tinha óleo, pedia e ganhava um pedaço de banha no açougue, e eu cresci assim: sendo criado na gordura de porco!!!

Sem luxo, sem brinquedo, sem histórias, descalço; livre, porém vigiado,

As minhas asas cresceram junto com a minha ambição, e no dia em que resolvi voar sozinho, me pegaram e me puseram na gaiola.

Não deixo a peteca cair, mas também não tenho vergonha de dizer, que me dá vontade de chorar, quando vejo minha mãe ter de vir me visitar...

BORGHA
Enviado por BORGHA em 18/02/2009
Código do texto: T1445762
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