VENHAM VER- A- MARAVILHA

Ver-o-Peso de Belém Ver-o-Peso de Belém
o mais completo cartão maravilha brasileira
postal que retrata bem feira que de um tudo tem
seu povo, cheiros e chão és Parauara faceira
                                                              SerPan

          Nossa querida Santa Maria de Belém do Grão-Pará que veio de completar, a 12 de janeiro de 2009, seus 393 anos de frutuosa e promissora existência – ela que começou como a primitiva atalaia do Norte, com seu fortim do Presépio, e é hoje a Metrópole da Amazônia – acaba de ganhar, entre outros regalos de aniversário, um precioso mimo. Seu mais representativo e conhecido cartão-postal, o Ver-o-Peso, foi eleito como uma das sete maravilhas do Brasil, o que muito contribui para robustecer nosso parauarismo, no dia 9 de janeiro p.p., em concurso livre e aberto realizado pela Internet e promovido pela revista “Caras”, com o patrocínio do banco HSBC, como se pode ver no sítio internetiano da revista.
          Durante mais de três meses para mais de um milhão de internautas do Brasil e do mundo tiveram a oportunidade de escolher, entre os trinta pontos turísticos de todos os estados brasileiros, previamente selecionados, os sete mais bonitos e atrativos. Anônimos e personalidades salientes participaram da renhida disputa que, ao final, apontou aquelas que, dagora em diante, passam a ostentar o galardão maior de maravilha brasileira. Interessante é que tal certame se realizou pouco tempo passado (julho 2007) da escolha, também pela Internet, das Sete Maravilhas do Mundo atual, dentre as quais figura, muito justamente, a estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro.
          Por ordem de classificação foram estas as locações escolhidas: a Fortaleza dos Reis Magos, no Rio Grande do Norte (1º lugar); a fortaleza de São José de Macapá, no Amapá (2º lugar), a Catedral da Sé, em São Paulo (3º lugar); o Conjunto Arquitetônico de Natividade, em Tocantins (4º lugar); a Feira do Ver-o-Peso, em Belém (5º lugar); o Centro Histórico de Ouro Preto, em Minas Gerais (6º lugar) e o Teatro Amazonas, em Manaus (7º lugar). Veja-se que a Região Norte abiscoitou nada menos que quatro dos sete lugares da lista dos mais belos cartões-postais do País, o que poderá ensejar, e certamente o fará, o incremento do turismo receptivo para esta região que não tem sido, ao longo dos tempos, muito lembrada pelos turistas nacionais e forâneos.
          A escolha do Veroca, como belenenses e parauaras em geral carinhosamente o chamamos, tem, assim, o justo e público reconhecimento de suas belezas, préstimos e importância, ele que é uma síntese de seu povo e o coração pulsante da cidade. O saudoso jornalista Edwaldo Martins dizia que “Belém acorda no Ver-o-Peso” e que “em meio às torres do Mercado de Ferro, que é a marca-símbolo da Cidade das Mangueiras, o seu cartão-postal, tão significativo para esta terra quanto a Torre Eiffel para os parisienses e o Cristo Redentor do Corcovado para os cariocas, que Belém abre o seu dia-a-dia”.
          No Ver-o-Peso, onde se pode encontrar “de um tudo”, no falar parauara, vocês conhecerão as mandingueiras, mestras na utilização de exemplares de nossa flora e fauna para a confecção de garrafadas e meizinhas que remedeiam todos os males: físicos, psíquicos e de amor. Ervas para curar caiporismo, panemice, quebranto, mau-olhado, coisa-feita, mandingas, fraqueza de homem e fastio de mulher; outras para atrair o sexo oposto, trazer de volta a pessoa amada e os banhos de cheiro para dar sorte e tirar o catingoso. Nossa Fafá diz que o Ver-o-Peso sintetiza a “mistura da cultura européia com a tradição cabocla, bem no meio da Amazônia”. Fato é que o Ver-o-Peso é a maior feira aberta da América Latina e uma referência turística na Amazônia. Lá estão locadas 1420 barracas, distribuídas por 20 setores, onde trabalham cinco mil feirantes e circulam, diariamente, 50 mil pessoas (dados da Secretaria Municipal de Economia - SECON).
          “Pelos brasis afora o Ver-o-Peso ganhou tanta notoriedade quanto a Rampa do Mercado ou a Feira da Água dos Meninos, em Salvador, da Bahia” a redizer Leandro Tocantins. O escritor espanhol Álvaro de Las Casas sobre ele assim se expressou: “Isto parece o Zoco Chico de Tanger ou o Vieux Port de Marselha”, com o olhar guloso de pitoresco. O rei Leopoldo, da Bélgica, em outubro de 1962, aí passou quase um dia inteiro filmando e fotografando os “costumes” e as “manhas” – artes, habilidades, destrezas – que tanto despertaram seu interesse, nos diz ainda Leandro.
          O multicolorido das velas que equipam as “vigilengas”, a azáfama dos caboclos nos barcos de todos os formatos e tamanhos, o troca-troca de mercadorias das mais diversas origens (porcos, galinhas, aves de variadas espécies, telhas, manilhas, potes e filtros de barro, caranguejos, peixes e que tais) passadas por entre redes armadas e o po-po-pô dos motores, conjuntos com os aromas, os cheiros mais diversificados, estão presentes desde as primeiras horas do dia e se estendem até que a carga se esgote e o “mestre” determine o momento conveniente da viagem de retorno e os barcos abandonem a doca em verdadeiras acrobacias aquáticas.
          Ponto sempre sujeito a interpretações diversificadas, algumas até caricatas, é o relativo ao nome da feira, bem como o início de sua existência.
          Os portugueses costumavam implantar em portos movimentados de suas colônias e mesmo em alguns atracadouros reinóis, continentais ou ilhéus, postos fiscais a que davam o nome de Casa do Haver o Peso ou do Haver do Peso, pois que os tributos eram determinados, quase sempre, a partir de um percentual estabelecido sobre o peso bruto das mercadorias (do ouro, por exemplo, era o quinto – lembram-se? -, isto é, tão-somente 20% a parte que tocava à Coroa, vale dizer: éramos felizes e nem nos dávamos conta disso!) ou então por conjunto de unidades (dúzia, grosa, arroba, quintal, cento, milheiro) dos quais eram retidos, em produtos ou espécie monetária, os tributos reais. Para isso havia de funcionar uma balança. Ernesto Cruz nos fala de uma dessas “casas de haver o peso” que existira no Rio de Janeiro, em 1614, para taxar o açúcar.
          A verdadeira data de origem de nossa casa fiscal ficou encoberta pela pátina do tempo e pela insipiência histórica destes confins setentrionais do Verde Vagomundo (sua licença, Bené?), sabendo-se apenas que se situava na “boca do igarapé do Piri”, sobre um trapiche equipado com balança para ver o peso das mercadorias e cobrar tributos. No meado do século XVIII o Grão-Pará já era o sustentáculo maior do erário real português, com as drogas do sertão, produtos da fauna e da flora e mesmo alguns minerais, visto que as minas de ouro das cidades coloniais mineiras estavam à exaustão. Uma Ribeira do Peixe Fresco foi mandada instalar ali, em 1839, por Bernardo de Souza Franco, Presidente da Província, em substituição à primitiva casa fiscal, a que o governo provincial denominou “doca da Imperatriz”, mas que o povo teimosamente continuou a chamar de Haver o Peso; com o correr do tempo, por contração, o nome ficou reduzido para Ver o Peso e assim se manteve até nossos dias. As casas fiscais foram sendo extintas e a primitiva denominação desaparecendo, só restando o nosso Veroca, que também se modificou, diversificou, ampliou e modernizou, principalmente com a construção da doca em forma de quadrilátero revestida de pedra e a ereção do Mercado de Ferro (atração à parte que deve ser admirada), levadas a efeito no alvor do século passado, na intendência de Antônio Lemos, sob a supervisão profissional do arquiteto paraense Francisco Bolonha, e o magnífico casario colonial que o circunda, exornado com azulejaria portuguesa vária.
          O Complexo do Ver-o-Peso, guardião de um riquíssimo patrimônio histórico e arquitetônico, também se reflete – e muito! - na economia da região. Consoante dados da SECON, responsável pelo gerenciamento do espaço, cerca de R$ 1,3 milhão são injetados, todos os dias, na receita do erário estadual, com a comercialização de diversos tipos de produtos. É o Complexo composto pelas feiras livres do Açaí e do Ver-o-Peso, a Pedra do Peixe, os mercados de Peixe e de Carne, além do estacionamento. O Ver-o-Peso não dorme nunca, o trabalho é ininterrupto, informa o Secretário Municipal de Economia, João Amaral.
          A Feira do Açaí recebe o maior volume do fruto na região, algo como cinco milhões de toneladas/mês, em sua maior parte provindas das ilhas próximas e do Arquipélago do Marajó. A Feira do Ver-o-Peso é o maior entreposto de pescado da região Norte e uma das mais movimentadas do País. Cerca de 80 toneladas/dia de diversos tipos de pescado, desembarcam na Pedra do Peixe, provindas principalmente da região do Baixo-Amazonas, Marajó e da costa paraense.
          Nas barracas, além de hortifrutigranjeiros, importados, mercearia, peixe seco, artesanato regional, aves e ervas medicinais, pode-se degustar, também, uma rica, apetitosa e única gastronomia genuinamente parauara, de criação indígena. Há lojas de comércio variado no contorno do Mercado de Ferro e no entorno da Feira.
Eis aí, caro turista do Pará ou de fora, em rápidas pinceladas, uma síntese da riqueza e da beleza de nossa feira-maravilha, que não passou despercebida aos olhos encantados do aclamado poeta brasileiro Manuel Bandeira que, em suas andanças por estas plagas, assim se referiu sobre ela:
“Nunca mais me esquecerei
das velas encarnadas,
verdes,
azuis,
da doca do Ver-o-Peso.
Nunca mais!”
          É isso, amigos! Venham ver e conferir.

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Médico e Escritor - ABRAMES/SOBRAMES/IHGP
serpan@amazon.com.br - sergio.serpan@gmail.com  -   www.sergiopandolfo.com

Sérgio Pandolfo
Enviado por Sérgio Pandolfo em 23/02/2009
Reeditado em 22/07/2011
Código do texto: T1453568
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