A VIOLÊNCIA CHEGA AO CAMPUS

Sexta feira passada eu me encontrei com Manuela, colega de faculdade e radialista da Universitária FM 103,3 – emissora pertencente à UERN – que estava visivelmente abalada, diria, em estado de choque. Acerquei-me dela, receoso de fazer-lhe alguma pergunta, porém, na expectativa de poder ajudá-la – se necessário fosse –, criei coragem e a cumprimentei:

- Bom dia, Manu! - falei-lhe em tom cordial, tentando imprimir, na voz, uma casualidade que estava longe de existir, pois cada palavra pronunciada por mim deixava claro que eu estava preocupado com a sua fisionomia naquela hora matinal.

- Oi, Raimundo, bom dia! - respondeu sem nenhuma convicção, apenas por educação.

- Está bem, fale-me o que está acontecendo.

- Estou traumatizada. Ontem à noite, eu e mais três amigas, saindo daqui da UERN, fomos abordadas, de forma violenta, por quatro jovens em um carro que, usando de uma violência sem precedentes, nos assaltaram e nos humilharam ao extremo. Durante o ato de bestialidade, colocaram armas em nossas cabeças, mandaram que nós nos deitássemos no chão, tiraram todos os nossos pertences e depois nos fizeram sair em desabalada carreira para dentro do mato que cerca o Campus Universitário - frisou quase sem voz.

- Onde foi isso, Manu? - Perguntei ainda espantado com o relato da amiga.

- Cerca de cinquenta metros da entrada do campus, na pista que dá acesso a ela. Eram vinte horas e nós íamos conversando, a pé, até a residência de uma de nós – que fica nesses blocos aqui perto da Aduern. De lá, cada uma de nós iria pegar seu transporte e ir para casa - completou.

Fiquei olhando para a minha colega, tentando imaginar o ocorrido e cheguei à triste conclusão de que, hoje em dia, os bandidos não são mais diferenciáveis, reconhecíveis. Jovens da classe média estão cada vez mais adentrando o submundo do crime. Eles usam meios ilícitos para conseguirem obter seus desejos de consumo – sem terem que trabalhar para isso, o que seria o lógico, o normal – se arriscando a terem sua liberdade cerceada e, com isso, perderem uma boa parte de sua juventude, muitas vezes, em troca da manutenção do vício das drogas ou do mundo do glamour.

Ainda tentando entender essa escalada da violência, me lembrei de fatos acontecidos recentemente no meu bairro, onde vários jovens foram mortos pelos seus próprios parceiros do mundo do crime, para dar exemplo, por eles terem tido uma atitude incorreta diante dos senhores do crime. Essa banalidade, em relação à vida, me preocupa ao extremo. Tira-se a vida ou perde-se numa proporção que não significa nada: tanto faz como tanto fez!

Antigamente – e não estou fazendo apologia – o roubo se dava, mas havia certa preocupação por parte do bandido em não ser tão explícito: esperava – no mínimo – a pessoa sair de casa, ou de perto do objeto, ou do veículo; procurava ser o mais discreto possível, quando adentrava uma residência, e quase nunca se utilizava da violência – até corriam quando eram vistos ou quando alguém gritava.

Hoje, infelizmente, as coisas mudaram, para pior: já não se pode mais colocar cadeira em sua própria calçada – como se fazia antigamente para prosear com os vizinhos –, recebendo o ventinho fresco do cair da noite. Esse ato tão saudável, hoje em dia, é um risco, pois você pode ser abordado, inesperadamente, por bandidos que descem de seus carros, lhe fazem refém, entram em sua casa e lhe ameaçam gratuitamente – até como um ato de masoquismo – usam de violência excessiva e levam tudo que estiver a sua frente. E essa é apenas uma das abordagens.

Ter um veículo, hoje em dia, é um risco em potencial. Eles param ao seu lado, botam a arma em seu rosto e mandam você descer. Isso ao meio dia em ponto, no lugar mais movimentado e com inúmeras testemunhas. E muitos ainda agem covardemente, tirando a vida de quem os reconheceu.

Depois dessas reflexões, olhei para a minha amiga e disse-lhe que, apesar de tudo, ela deveria agradecer por nada ter acontecido fisicamente com ela e com suas amigas, e que coisas materiais – apesar do prejuízo – eram mais fáceis de repor. Entretanto, não quis me referir ao trauma que toda aquela agressão iria causar em seu íntimo, em seu amor-próprio, em sua confiança para com os desconhecidos dali para frente.

Particularmente, espero que esse incidente, na porta da universidade, sirva para que as autoridades tomem providências e reforcem a segurança do perímetro e deem, com isso, liberdade para nossos alunos irem e virem sem medo de serem interrompidos em suas caminhadas de cidadãos.

Por fim, lembrei-me da ironia do destino: o presente que ela e suas amigas ganharam – na noite anterior ao Dia Internacional da Mulher – foi justamente terem sido assaltadas por quem deveria dar os parabéns e agradecer por elas existirem: os homens.


NOTA DO AUTOR: Esta crônica foi lida no Dia Internacional da Mulher, do ano passado (2008), no Programa Tarde Universitária, da FM 103,3, pertencente a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.



Obs. Estrada que dá acesso a Universidade (UERN) - Imagem da internet


 


Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 12/03/2009
Reeditado em 05/12/2011
Código do texto: T1483194
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.