MULHERES PERDIDAS - PERDIDA EM MEU PRÓPRIO LABIRINTO A CAMINHO DE UQBAR

E lá ia eu meio desarvorada, tentando fugir de não sei o quê, caminhando sem rumo certo por uma dessas veredas da vida, que nem me dei conta de um amigo meu que me seguia a passos largos. Era tão idiota e desligado quanto eu e ainda por cima era metido a intelectual o infeliz . Juntou-se a mim para chorar suas mágoas; estava fugindo também, e foi logo perguntando: você sabe onde fica esse país Uqbar? Saber eu sabia, pois li Ficções de Jorge Luiz Borges, mas como não estava afim de muita conversa, respondi assim: eu não, então ele emendou : se não me engano fica pras bandas do Iraque ou da Ásia Menor e prosseguiu: estou sabendo que está havendo por lá uma gigantesca conspiração de intelectuais para imaginar a criação de um novo mundo, a quem daria o nome de Tlon. Que tal irmos nos juntar a essa gente e conspirar um pouco, já que andamos tão injuriados com este mundinho aqui? É..., pode ser, tô fazendo nada, mas como é que a gente chega lá? Perguntei. Ô criatura de Deus, para que serve a imaginação? Senta aqui perto de mim, dá tua mão, feche os olhos, concentre-se, que te garanto alcançaremos o destino. Ham, ham... disse eu e fiz o que o amigo mandou. Mas quando abri os olhos, estava só, acho que concentrei errado, ele foi e eu me perdi pelo caminho, ou mais precisamente dentro do meu próprio labirinto físico. E por não falar a língua dos anjos, cadê achar a saída? Prendi um pé num emaranhado de vísceras, chutei um útero, pisei um rim, fui imprensada entre dois pulmões ,caí em cima de um baço, tropecei num pâncreas, deslizei num fígado, esmaguei uma vesícula, até chegar ao centro da cavidade torácica, onde percebi um órgão oco com duas câmaras uma superior que se dilatava quando recebia sangue e a outra inferior que se contraía quando ejetava esse sangue. Eu fiquei observando aquilo, sabia que era o coração, e se ele era oco, por certo os meus sentimentos, os meus amores, as minhas saudades, as minhas lembranças as minhas tristezas, as minhas alegrias, os meus momentos felizes estavam todos dentro dele... Então..., eu pensei... é... Se eu conseguir sair daqui, tentarei arrancar desta coisa oca e levar comigo algumas coisinhas que andam me incomodando... Como fazer era que eu não estava sabendo. Também não sabia como sair desse labirinto, estava realmente me sentindo perdida. Lembrei do meu camaradinha, devia também estar pegando tempo lá por Uqbar, como estaria sendo feita a comunicação com os heresiarcas? Está me dando sono, é tudo tão escuro aqui por dentro... E eu me pergunto, teria algum sentido eu estar perdida neste labirinto? Os gnósticos consideram o labirinto como um símbolo de iniciação. Em seu percurso haveria um centro espiritual oculto uma dissipação de trevas e luz e o renascimento pessoal. Nesse sentido a superação seria encontro da verdade ou opus... Eu acho que dormi... Mas quando acordei ao meu redor já não havia trevas e sim luz aí eu pensei: será que aconteceu o meu renascimento pessoal? Eu encontrei a verdade? Contudo, só de uma coisa eu sei: estava fora do labirinto e fazia o caminho de volta para o lugar de onde eu jamais deveria ter saído...

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Este texto faz parte do II Desafio Recantista de 2009.

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Zélia Maria Freire
Enviado por Zélia Maria Freire em 27/03/2009
Reeditado em 28/03/2009
Código do texto: T1509821
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