Lembranças de Infância

A minha infância foi rica, mais muito rica mesmo, tão rica que a única coisa que não tinha era dinheiro. Jogávamos bola no campinho construído no terreno baldio na frente de casa. As traves eram feitas de bambu, estes eram cortados próximo ao clube, por toda galera.

A área do gol, pra não machucar o goleiro era recheada de palha de arroz, que buscávamos numa fábrica de arroz nos arredores de casa.

Mas o futebol tinha seu horário e de finais de semana, pois nossa agenda era corrida. Saíamos de casa bem cedo íamos ao clube, voltava para o almoço e em seguida clube de novo: nadávamos, esportes e tudo mais. Por volta das quatro horas da tarde voltava para casa sedento e louco de fome para tomar o café. Terminado o café seguíamos de volta ao clube onde ficávamos até 6 horas da tarde.

Como as inúmeras oportunidades de brincadeiras eram quase infinitas, cada dia uma coisa: tínhamos também um carrinho de rolimã, que descíamos a rua asfaltada de mais ou menos 150 metros. Para não sermos atropelados, enquanto um número de carrinhos descia, outros que esperavam sua vez ficavam nas extremidades para não deixar nenhum carro invadir “nossa rua”.

Mas o carrinho de rolimã era sem dúvida o maior causador de danos físicos em nós. Certa vez fizemos um super carrinho, que juntado os vagões dava mais ou menos dois metros. Subíamos a rua cada um com seu vagão e lá chegando uníamos ao primeiro vagão e todos se postavam no seu, descíamos rua abaixo em toda velocidade e aos gritos.

Numa certa ocasião um dos amigos enroscou a perna num rolimã e como não tínhamos condições de brecar, pois a descida era muito íngreme, o nosso amigo foi ralando a perna e o pé até o final e quando terminou estava totalmente escalpelada sua perna.

Outra de nossas brincadeiras era a voçoroca, pequeno cânion existente em nossa cidade. A turma de vinte a trinta pessoas de lá não saíamos antes do anoitecer, enlameados de barro.

No mês de julho era a vez dos papagaios, soltar aqueles pequenos “aviões” construídos com papel, vareta e cola era um supra sumo para todos e o desafio de quem conseguia ir mais alto tomava toda tarde.

E o picolé, bem na vizinhança tinha o Seu Mario que vendia um dos melhores picolés que tomei, por míseros 50 centavos: abacaxi, groselha, caju, limão.

Tinha também o bosque municipal, lá brincava de uma das coisas mais sem sentido, mas era delicioso, que tenho lembrança. Junto com meus irmãos íamos até o bosque municipal que tinha dois lagos e nós tínhamos uma prancha de surf – não,na minha cidade não tinha praia – e colocávamos a prancha na água tomava uma certa distância e corria e pulava encima da prancha que deslizava até cairmos.

Outras das mais sem sentido brincadeiras que tínhamos era entrar dentro de um tonel de latão, sem o fundo e a tampa, vazado, e descia toda ladeira até se chocar com o murro, e quando saímos de dentro do latão não conseguíamos andar de tanta tontura.

Enfim, muitas outras brincadeiras existiam, e todas sem exceção construída e imaginada por nós na maior ingenuidade e simplicidade de crianças, que queria apenas brincar.