UM PARTO DIFERENTE

Esta semana, quando eu estava na Universidade, assistindo a uma palestra sobre Semiótica, recebi uma ligação da poeta Ângela Rodrigues, me comunicando que tinha dado a luz ao seu primeiro filho.

Confesso que, no primeiro instante, eu tomei um susto danado. Primeiro, por Ângela me ligar, já que não temos uma amizade mais aproximada – só sendo considerada amizade devido à troca, esporádica, de e-mails e de regulares comentários, nos escritos que ambos mantemos no Recanto das Letras; segundo, por achar que ela estava com febre e delirando: por inúmeras vezes eu juro ter visto fotos, na sua página de escritora, no Recanto, onde aparecem seus dois filhos biológicos e os outros dois filhos do coração.

No entanto, não querendo contrariá-la, saudei-a com entusiasmo, parabenizando-a pelo rebento. Se era uma pegadinha, resolvi que entraria nela com gosto de gás!

- Professor, estou a pé, aqui na Uern, e estou precisando ir aqui pertinho, pegar meu filho que nasceu ontem – falou, no outro lado da linha, a recém-parida que se encontrava no mesmo espaço em que eu me encontrava.

Arre égua! Foi a primeira coisa que exclamei. Em seguida, pedi desculpas. Depois, apenas ouvindo o que ela continuava a dizer, efusivamente, fiquei matutando: como pode uma mulher parir, um dia antes desta conversa, e já estar circulando normalmente por aí? E, ainda mais, sem o filhinho que nasceu?

Bem, eu só podia saber da verdade, comprovar tudo que ela estava dizendo se fosse prestar o favor que ela estava me pedindo, ou seja: ir buscar o filho dela, com ela.

Fomos.

Antes, a primeira coisa que fiz, quando a avistei, foi olhar diretamente para a sua cintura. Discretamente, claro. Aparentemente, parecia que ela estava ótima para quem tivera um filho um dia antes.

Cumprimentamo-nos. E eu, para não perder a viagem, parabenizei-a pelo nascimento do seu filho. Ela não se fez de rogada: agradeceu e, ainda me disse que era um menino, robusto, com saúde e de uma aparência, para quem tinha nascido de uma longa e demorada gestação, maravilhosa.

Acreditei. Mas, como não sou de todo inocente, fiquei com um pé atrás ou, como se diz popularmente: com uma pulga atrás da orelha.

- Ângela, você me disse que seu filho estava pertinho daqui. Posso saber onde você o deixou para poder vir aqui? – Perguntei, enquanto entrávamos no carro.

- Professor, o Caio Cesar, da Coleção Mossoroense, me ligou, hoje pela manhã, me pedindo para eu ir pegar minha cria, pois ele reclamava a minha presença, urgente! – Respondeu ela com um sorriso que não cabia dentro da boca.

Decididamente, ela estava com algum problema emocional. Mas não parecia ser nenhuma gripe suína ou febre amarela. Era estranho. Para desvendar o mistério, eu me revesti de Sherlock Holmes e fui seguindo as pistas deixadas pela suspeita. Desculpem-me: fui seguindo as orientações do itinerário dadas por ela.

Nessas alturas do campeonato, mudar o teor da conversa foi a melhor estratégia que encontrei para tentar descobrir se a caríssima escritora estava com algum problema neurológico. Não consegui muita coisa não.

Finalmente, a Fundação Vingt-un Rosado, local que abriga a Coleção Mossoroense. Caio Cesar estava esperando-a. Cumprimentou-a, parabenizando-a, também. Estranho! Até Caio!?!?

Entramos no local onde se respira cultura. No espaço, no mínimo, uns vinte mil livros. No centro, ainda embalado, o filho de Ângela. Melhor dizendo: os filhos de Ângela. 250 no total. Filhos que não acabam mais! Haja leite. Aliás, haja leitores!

Ângela, quando os viu, pareceu que voltara a ser criança. Sorria francamente, enquanto segurava, em suas mãos, um deles. Brincava, acariciando-o contra o seu rosto. O seu olhar era de pura felicidade, e a alegria com a qual o segurava, era como a mãe que acalenta e dá “dengo”, só tendo olhos para o fruto de seus sonhos.

Fiquei impressionado e, ao mesmo tempo, contagiado com toda aquela beleza. Como um sonho transformado em realidade nos torna tão sensíveis e, aparentemente, sem mais problemas! Ela, com certeza, estava vivendo um dos seus melhores momentos. Sim, ela acabara de receber, do Editor da Coleção Mossoroense, os livros a que tinha direito por ter ganhado, na categoria Poesia, o Prêmio Rota Batida, da Petrobrás.

Dei-lhe os parabéns, também. E pedi perdão pelos pensamentos errôneos. Definitivamente, não sou um detetive.

Ah, na saída, já quase no portão grande, Caio gritou lá de dentro:

- Raimundo, você vai ser pai na semana que vem!

Gente, não sei o porquê, mas acho que essa tal de gestação mexe com a nossa estrutura. Eu estou até achando que estou grávido de verdade!



Obs. Na foto, eu, a mãe e o diretor da Coleção Mossoroense no exato momento em que ele entregava o "filho" a pós parturiente.
Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 10/05/2009
Reeditado em 06/12/2011
Código do texto: T1585948
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