A CASA CAIU DE NOVO...

Esta semana, numa noite muito bonita, dessas em que a gente tem gosto de olhar para o céu e ficar declamando versos apaixonados – mesmo que seja para adorar a lua clara e resplandecente lá no céu –, eu fui tirado dos meus pensamentos poéticos, por um ex-funcionário da escola, casado, pela primeira vez, com uma ex-aluna minha e, pela segunda vez, também, com uma ex-aluna minha, e que hoje está lotado em outra instituição de ensino.

Ele me cumprimentou, efusivamente, pois já fazia certo tempo que nós não nos víamos. Apesar de gostar de ficar num cantinho lá da escola, no momento de intervalo, sozinho, devaneando e escrevendo poesias na minha imaginação, vê-lo, foi um motivo de satisfação para mim. A despeito da aparente alegria do jovem, percebi, em seu semblante, uma ponta de preocupação.

- Boa noite, rapaz! Por onde tem andado?- Perguntei-lhe para iniciar a conversa.

- Por aí. Fazendo mil coisas para tentar chegar ao final do mês e ter dinheiro para pagar as contas. De manhã, vou para a escola; no período da tarde, sou moto-taxista e, à noite, estou completando o dia, ajudando na lanchonete de um primo – disse ele, passando a mão pela barba rala.

Realmente, pensei, hoje em dia se faz necessário uma multiplicação de esforços para se poder viver dignamente, ou para não começar a passar necessidades, ainda no meio do mês.

- Mas, me diga: como vai sua esposa, está tudo bem? – Perguntei-lhe.

- Ela vai bem, eu é que não vou, professor. Sua voz saiu num sussurro quase inaudível.

Pronto! Eu sabia desde o início que aquela passada de mão pela barba significava problemas pessoais.

- Como assim? – Inquiri.

- Ela acabou de me dar o cartão vermelho, professor. Cheguei em casa, agora à noite, e os meus “troços” estavam arrumados – alguns na sacola, outros em caixas de leite – e ela não quis nem um diálogo para eu poder colocar meus argumentos.

Vi que a situação era complicada. Sabia também que ele já havia levado esse mesmo cartão, com a primeira esposa, e por dois motivos: farras e namoro. Será que a história se repetia? - Conjeturei.

- E aí, o que você vai fazer? – Perguntei-lhe, já me lembrando que, da primeira vez, a esposa tinha jogado suas “coisas” dentro de um saco e amarrado no poste defronte a casa onde moravam. Lembrei-me, ainda, que ele tinha sido motivo de troça, por parte dos conhecidos, e que tivera até que passar um tempo longe do bairro para que a turma esquecesse. Fora chato, de verdade. Agora, a vida reeditava o passado, e o fazia passar o mesmo vexame, embora a culpa, quase com certeza, partisse dele mesmo.

- Não sei não, respondeu. O pior é que não tenho para onde ir. Desta vez me pegou desprevenido de tudo. Lá, na casa de mamãe, está lotado e, mesmo que eu vá para lá, só tem lugar debaixo do pé de manga.

Vendo que ele estava meio desorientado, tratei de acalmá-lo, fazê-lo raciocinar. Disse-lhe que ele devia ter um amigo ou um parente que pudesse lhe dar abrigo por aquela noite e que, de manhã, cabeça fria, ele, com certeza, encontraria uma solução temporária para o seu recomeço.

- Só me diga uma coisa: por que foi que sua esposa foi tão radical nessa decisão, pois se a conheço bem, ela é uma pessoa calma, paciente e não é extremista em suas decisões. O que foi que você fez desta vez? – A minha pergunta tinha endereço certo, visto que, o distinto conhecido tinha por costume arrastar asas para tudo quanto fosse mulher.

- Sabe como é professor. Trabalhando de moto-táxi, a mulherada dá em cima, sem pena. Eu como não sou santo, me derreto todo. Tenho a carne fraca. Aí, quando chega a noite, lá no meu primo, assim que acaba o expediente, a gente vai “tomar umas para relaxar”. Algumas vezes, para não perder o horário do expediente matutino, eu já vou direto de onde eu estou. Assim, quando eu chegava em casa – no outro dia à tarde, ela sempre me prevenia que eu ia “dançar”. Não acreditei. Confiei no taco. Errei.

Falando sinceramente: não sabia se ria ou se permanecia sério, tentando encontrar uma saída para o infortúnio do pobre playboy, literalmente. Mas, não foi possível ficar sério, por muito tempo, depois do que ele disse para finalizar a nossa conversa e seu desabafo:

- O pior é que ela já avisou que eu tenho que pagar o aluguel da casa, dar a pensão para a nossa filhinha e pagar uma babá. Desta vez eu me “lasquei!”

Na saída, depois que nossos risos foram controlados, ele me confessou:

- Ô mulher “besta”, fazer tudo isso só porque eu tinha umas a “mais” na cabeça e convidei a irmã dela para sair comigo! A carne é fraca!






 
Obs. Imagem da internet


Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 17/05/2009
Reeditado em 06/12/2011
Código do texto: T1598896
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