O MENINO QUE NÃO SABIA MENTIR

Poderíamos chamar por qualquer nome pequeno e gracioso àquele menino. Lucas, Wagner, Cecé... Aos cinco anos, sua aparência física não denotava haver transcorrido mais que quatro anos o tempo em que a família convivia com o estranho menino. Todos amavam o seu jeito e ansiavam por sua fala. Mal chegara aos três anos de idade, os pais, desesperados e já desanimados de tanto buscar recursos médicos. Ninguém conseguia diagnosticar o porquê do seu silêncio.

O nosso menino ouvia bem e nada errado havia com suas cordas vocais. E, não falava. Aos cinco anos falou. Foi-lhe perguntado o motivo de seu silêncio obstinado. Pais, vizinhos, tias e madrinhas, médicos, amigos, conhecidos, curiosos, todos queriam saber. A essa pergunta o menino não respondia. Um dia arrazoou.:

- Eu fiquei calado para aprender com vocês. Para conhecê-los. Falou em outras palavras, no seu recém-adquirido repertório. Mas assim se fez entender.

Você aprendeu muito conosco, meu pequeno? Quis saber o pai. Então, aprendeu a conhecer a mamãe? A senhora Alves muito aflita...aguardava o parecer infantil.

- Sim e não. Mais sim do que não, disse o pequeno.

- Como assim? Explica isso, meu filho.

- A mamãe briga comigo porque eu como muito ou por que eu como pouco. Bate em mim quando eu penso estar fazendo o certo e quando eu apronto, ela nem vê. Diz que gosta da Tia Mirna, mas manda dizer que não está e não atende aos seus telefonemas. Empresta algo a alguém, depois se arrepende e se irrita. Não sabe quando o papai é sincero e quer que a vovó se recorde daquilo que ela simplesmente deletou de seu consciente. Não gosta da empregada e lhe dá diversos presentes. Gosta de suas amigas e fala mal delas.

- Chega meu filho! Eu não sou assim...Sou!? Querido, eu sou assim? Desta vez dirigindo-se ao marido. Surpreso e atônito, o pai não respondia.

Antes que o pai responda, já meneando a cabeça em sinal de não, o menino que não falava, apressa-se a continuar:

- O meu pai pensa algo e diz outra coisa. Manda fazer de um jeito e faz diferente. Diz-me para não pisar no sofá e põe os pés calçados sobre o mesmo. Para eu não urinar fora do vaso sanitário, e a senhora sabe, o que ele faz... Fala que eu não devo andar sem roupa pela casa e desfila de cuecas...que eu não posso demorar-me jogando no computador e passa horas navegando na Internet. E conclui:

-Pode dizer a todas as pessoas, mamãe e papai “Àquele que me perguntar, e aquilo que quiserem saber, agora que eu falo, vou falar tudo...na bucha!!!