EnSHUgando Palavras.

À 
MARIA FERNANDES SHU

    
Talento é um sinal benigno e congênito que marca uma vida e morre com quem o possui. Descobri-lo é conhecer-se. Desenvolvê-lo é a primeira manifestação de genialidade a acontecer precocemente, ou num outro estágio das inquietações  humanas. Em qualquer dessas fases, não raro o talento se aflora. E se é literário o talento, explode em letras.
     Maria Fernandes Shu experimenta a segunda fase dessa descoberta, que ela diz ser recente, e eu, não tardia. Digo que no momento certo e mais propício o talento veio-lhe à tona em torrentes de inspirações, desaguando no mar da prosa. Prosa no mais bem dosado tom, tempo e colorido humor do conto e da crônica estilizadas concisamente na precisão do vocábulo e as devidas delimitações do campo semântico. Nesta área, Shu habilmente joga, divide e conduz o linear da frase certeira, rápida e direta em seu discurso entre o formal narrador, o coloquial personagem e o leitor que ela dribla na conclusão e "shuta" pro gol.
     Não há mulheres desprovidas de encanto, muito menos de talento. Despercebidas é que são algumas por desatentos farejos masculinos. Quando uma mulher se descobre na arte da palavra, desta nasce outra, a escritora, que assume uma condição mais visível e mais atraente, não sem preservar outros encantos. E Shu aponta este perfil de que pouco sei (e nem de todo saberia), mas farejo em suas letras e linhas. Quando a li pela primeira vez, fiz um comentário jocoso e sem malícia associando àquele prazer o sabor de um café com leite matinal. Mas à medida que fui me deliciando com o sabor de suas crônicas e contos, as leituras me deram um outro paladar: café com letras. 
     O talento lhe é tão sutil, que, na forma discreta como se apresenta, abre espaço e deixa à vontade o leitor para opiniões. A mim, especialmente, que adentrando a “
Casa Colorida
”, achei o fio condutor para esse comentário mais amplo a que ouso chamar de crônica. Para isso cuidadosamente tiro os “sapatos literários”, “quebro o protocolo” purista,“abro a geladeira das palavras” e aqui brindo com a taça de suas metáforas a alegria desta “casa engraçada” em que como e bebo e me inebrio de talentos. Talentos de Shu, umas das melhores aquisições do Recanto das Letras, ainda que ela assim não se considere. Mas o público leitor é quem dá esse testemunho, sem que isso lhe suba a cabeça ou a coloque no patamar da vanglória, onde um pequeno grupo de deslumbradas "estrelas" se acha.
     Quem está a seis meses nesta casa já repleta de quadros e paisagens que o pincel das letras traçou, há de mudar-se logo para um outro espaço que comporte tão crescente e variada produção artística. Tudo em Shu leva a marca personalíssima do seu humor inteligente, seja na prosa (contos e crônicas), seja em versos, nos quais o romantismo banal cede lugar à temática igualmente atual, bela e divertida.
     Maria Fernandes Shu é a mulher e a escritora ao seu tempo. Impressiona e fascina a criatividade na elaboração de textos a partir dos títulos. O cotidiano expresso em fleches parágrafos (Viagem), que narram do imaginário fantástico (“Mulheres Perdidas
no Estrangeiro”) ao trágico (“Roubo dos Ossos”, “Toque”) hilariante (“A diarista e o Metrossexual”) passando por reminiscências da infância ou indo ao erótico, sem chegar à grotesca apelação. Pois quem sabe escrever e da arte da palavra produz literatura, sabe exatamente externar um pensamento, na elaboração de uma frase, "enshugando" palavras.

Brasília, 29 de maio de 2009
LordHermilioWerther
Enviado por LordHermilioWerther em 29/05/2009
Reeditado em 13/01/2012
Código do texto: T1621473
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