Renato

Renato sempre surpreende. Renato é o rapaz que guarda os carros em frente ao prédio onde eu trabalho. Estamos costumados a nos encontrarmos diariamente e trocarmos algumas palavras. Por me ver sempre com a bata que uso para trabalhar, ele se acostumou a me chamar de professor.

Gosto das histórias que ele conta no curto espaço entre a porta do meu carro e a portaria do prédio. Não acredito que sejam verdadeiras, entretanto prefiro não julgá-las dessa maneira. Uma boa história é uma boa história e pronto. Além disso, li em algum lugar que a verdade é apenas uma mentira que se esqueceu de acontecer. Desde então acredito piamente nisso, mesmo que não seja verdade. Eu gosto de clichês.

O rapaz ganhou minha simpatia em um dia particular quando cheguei ao prédio ouvindo Capital Inicial e, para a minha surpresa, ele continuou cantando a letra mesmo quando a música já havia terminado. Naquele dia ele disse algo sobre como em geral ninguém presta atenção em letras de música, apenas as repete sem entender seu significado. Pois é.

Todavia, não há nada de especial em Renato a primeira vista. Vinte e poucos anos, moreno, magro. Ele parece ser mais uma dessas pessoas que teve poucas oportunidades e as poucas oportunidades que teve as bebeu, fumou, cheirou ou injetou em seu corpo. É uma pena, ele merecia mais.

A surpresa mais recente aconteceu sexta passada. Eu tinha acabado de sair do carro e estava indo comprar cigarros em uma banca próxima quando Renato apareceu diante de mim e me lançou a seguinte pergunta: “Professor, o que a gente faz pra ser feliz?”.

Olhei-o fixamente por alguns instantes e não soube o que responder. Disse apenas que voltaria com alguns cigarros e uns trocados para ele. Pois é, Renato sempre surpreende.