Profissão: "DESEMPREGADO"

Estou sem um emprego com carteira assinada há 17 meses, isso não quer dizer que não esteja trabalhando, tudo bem que não é a mesma coisa de ter o seu salário garantido no fim do mês, mas pelo menos consigo auxiliar a pagar as contas (as contas não querem saber, ou paga e continua usando, ou...), a vida de um desempregado tem todo um ritual, na verdade não existe uma regra, (no meu caso depois de oito anos empregado seguindo a mesma rotina de acordar cedo, pegar condução, registrar o ponto “o famoso bater o cartão”, iniciar a jornada, parar para almoçar, voltar novamente à jornada, bater o cartão, pegar a condução, chegar a casa, tomar banho, jantar e dormir), ufaa!!!! Só de lembrar já estou cansado. Foi muito difícil acostumar com uma nova realidade.

Nos primeiros cinco meses, devido ao seguro desemprego, acordava as nove, almoçava lá pelas duas, tirava uma soneca, dava uma volta no bairro, ligava a TV, comia um lanche, e ia para a faculdade (voltei a estudar), na volta tomava um banho, ligava o PC, e depois assistia o Jô soares, só dormia quando o programa acabava.

Além do seguro desemprego, ainda tinha uma reserva da poupança e do FGTS, a preocupação era mínima, por morar em sítio comecei a mexer na terra, plantar uns pés de fruta, fazer um jardim, aterrar o terreno, tudo sem pressa para terminar, bebia uma água, um café, batia um papo com o vizinho, queria mesmo era que o dia passasse lentamente, no rádio uma música sertaneja, “vida boa... Victor e Léo”, naquele momento não queria saber de receber ordens, ou cumprir horário, ali, eu mesmo era o meu patrão.

Na faculdade não tinha problema com os estudos (o que não faltava era tempo para estudar), na verdade o emprego nunca foi um empecilho, trabalhei e estudei durante um ano e meio e as minhas notas sempre eram boas, apesar de que não são todos que conseguem isso, realmente é difícil conciliar, mas não impossível.

Nas férias de julho aproveitei para dar um belo presente a mim mesmo, uma viagem de um mês para a querida Bahia, percorri de norte a oeste o estado, visitando os parentes, (o meu desejo era ter ficado por lá, porém como estava estudando, tive que voltar), nesses trinta e cinco dias de passeio conheci novas cidades (Senhor do Bonfim, Andorinha, Feira de Santana) e revi outras já conhecidas (Santa Maria da Vitória, Bom Jesus da Lapa), durante o percurso entre uma e outra cidade ficava vislumbrando a paisagem tão seca e ao mesmo tempo tão viva.

Nas cidades que ainda não tinha tido a oportunidade de conhecer, a minha visita foi aos parentes por parte de mãe, todos até então desconhecidos, a recepção foi com tanta alegria que não sabia como agradecer a altura, belos quinze dias de puro sossego, calor e diversão, tão bons que tenho saudades até hoje. Os outros quinze dias foram reservados para rever os parentes por parte de pai, esses fazia muito tempo que não os via, também foi uma bela experiência, rever a gruta de Bom Jesus da Lapa e depois subi-la, o Rio São Francisco, o Rio Corrente, a Praça do Jacaré, beber água de coco a vontade, sentir o calor gostoso dos fins de tarde, as saudades são intensas.

Depois desse presente (revigorei uns cinco anos), de volta a São Paulo na dura realidade do dia-a-dia, e com os estudos em andamento, a situação não era mais a mesma, o seguro desemprego tinha terminado, as contas continuavam a chegar, tive que recorrer ao FGTS até encontrar outro emprego, montei alguns currículos (falar a verdade, nos dias de hoje é muito difícil conseguir algo sem ser por indicação), e comecei a entregar nas agências de emprego, a rotina, até então tranqüila, não era mais a mesma, o sono começava a ficar escasso, a fome diminuía, a concentração nos estudos não ia bem, o riso mais comedido.

Confesso que se a pessoa não for equilibrada e a família não der todo o apoio necessário, ou fica louco, ou vai roubar, principalmente para aqueles que tiveram a sua, triste mais “abençoada”, rotina furtada de um dia para o outro, no meu caso continuei seguindo mais ou menos o padrão do início de ano, só que agora dormia pouco, para melhorar o ânimo, um cooper pela manhã, mais leitura, aumentei um pouco mais o jardim, introduzi a atividade da escrita, na faculdade os trabalhos escritos (pesquisas, digitação, impressão) do meu grupo ficou por minha conta, tudo isso para não perder o foco.

Com alguns serviços que consigo, ajudo em casa e guardo o restante para quando necessitar, contudo nunca é o suficiente, não vou aqui ocultar que recebi durante esse período algumas ofertas de emprego, só que nenhum dava a possibilidade de conciliar com os estudos, sei que não sou o único nesta situação, igual a mim há milhões, e infelizmente até alguns em situações piores do que o meu. Por que não, o governo nos ajudar com a continuidade do benefício, ou melhor, ajudar as empresas “sérias” a proporcionar mais empregos???

Na faculdade estranham como consigo sem um emprego ainda continuar estudando (rumo ao quarto semestre), também não sei, o que posso dizer é que com tanta profissão nova surgindo no mercado de trabalho, porque não criar mais uma, estaria com doze meses de carteira assinada, a todos os desempregados buscamos o direito ao emprego ou a regulamentação dessa nova profissão, tão atual e tão emergente:

“Profissão: DESEMPREGADO”

Regor Illesac
Enviado por Regor Illesac em 06/06/2009
Reeditado em 06/06/2009
Código do texto: T1635173
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