NÃO QUERO VENCER O CONCURSO.

Escrevi aqui durante o correr do ano passado alguns textos. Algumas pessoas leram, outros não. Não se interessaram pelo tema, estilo ou ambos. Médico deve ter o dever de saber diagnosticar e curar doenças (se possível), não de ficar perdendo tempo sem aproveitar o espaço oferecido para escrever coisas que os leitores poderão ler, crescer e lucrar, afinal. Já recebi essa crítica. O que o leitor queria mesmo, no meu julgamento, é que eu marretasse Deus e o Diabo. Não nasci ontem; não desejo criar polêmica ou rusgas com nenhum deles.

No jornal em que escrevo há pessoas mais capacitadas para escrever sobre os temas sugeridos por ele com mais competência do que eu. Escrever é algo que vem de dentro, com a gente, creio. Não se encontra em árvore ou cavando a terra. E por quê o tal crítico não faz aquilo que ele deseja? Não dá pra comprar... ou dá? Não há nenhuma possibilidade de fazer de um estudante brilhante ou medíocre um escritor, ainda mais porque... Ah! Sei lá por quê. Já pensou um time de futebol com onze Pelés? Sim, onze! (Ah, sim! Mais uns cinco deles no banco para o acaso de uma contusão). Vamos mandar bala; mole fazer Pelés? Uma ova!). Já li que era fera também no gol, mas lá frente inigualável. Então...

Uma ex-aluna do meu tempo de professor numa cidade mineira, nos idos de cinquenta e seis ou sete descobriu através da internete e travou conhecimento com algumas coisas escritas. Também tomei conhecimento através de trocas de e-mail de que ela é uma escritora premiada, fato até certo ponto de orgulho porque fui seu professor quando ela fazia o curso de admissão ao ginásio. Aqueles negocinhos bestas de decorar preposição, conjunção e tantas outras asneiras sem saber porque e para quê e “vamos que vamos: “tem” prova amanhã.”

Teceu elogios sob o seu ponto de vista crítico por crônica escrita há algum tempo e insistiu para que eu a enviasse para concursos literários. Segundo ela, teríamos que divulgar o texto. Já participei de uns poucos e constam em algumas publicações por estar sempre entre aqueles escolhidos para feitura do livro.

Orientou-me com endereços de concursos literários e resolvi remeter para um deles. Revi o texto um milhão de vezes. Mudei aqui; acrescentei ali; retirei palavras ou parágrafos dali; voltava ao início, recoloquei... Feroz luta de Dirceu contra Dirceu. Ufa! Sempre encontrava senões pois não tenho um revisor à disposição. Enviei-o.

Somente após isso feito é que fui ler o regulamento com cuidado tintim por tintim. Levei um susto. Constava lá se o trabalho fosse um dos escolhidos eu teria de abrir mão da sua posse; autoria, sei lá mais. Ainda estou meio zonzo. Como? É a mesma coisa vender um filhote seu. Seja: eu perderia uma criaturinha, eu passaria a posse ou o pátrio poder ou tudo o mais que houvesse sobre aquela obra.

Pô! Quando escrevo o que seja, sinto que o produto gerado é semelhante, tem a ver sob alguns aspectos aos filhos produzidos e tidos. Nada paga, nem são feitos para ser negociados. Partilhar a obra com outros, sim; senão seria egoísmo se alguns dos grandes escritores somente escrevessem para si. Teria graça nenhuma!

Eu não quero vencer o concurso. Sei que de nada vale torcer para sim ou não, mas estou muito ansioso. Não queria receber nenhuma comunicação, pretendo ficar quietinho depois de novembro sem ouvir falar em concursos literários. Perder o que considero ser a paternidade de qualquer coisa nascida por minha ingerência mesmo simplesmente teclando letras, brincando com elas, trocando-as de lugar, afinando concordâncias ou quebrando a cara com regências nem sempre aplicadas com decência é como interferir pensando no bem do descendente. Tudo isto acima é a gestação de uma obra inicial. Depois o parto. E quem teria coragem de se desfazer do rebento?

Alguém poderia arguir, se falo tanto da genética, da naturalidade com que me exprimo de haver em cada um de nós poderosos genes futricas e remotos nos fornecendo guias, forçando-nos roteiros e veredas para irmos avante, sem pesar as consequências. Quem sabe se não é exatamente assim? Quem sabe se apesar da nossa ignorância atual não abrigamos nos núcleos das nossas células genes até então dorminhocos e pertencidos também àqueles invejáveis romanos, gregos e tantos outros, lá atrás, criadores e regentes de pensamentos excitantes invejados ainda hoje? Por quê a genética não estaria metendo aí o seu bico? Olhe, olhe! Não aposte contra por enquanto!

Eu não quero ganhar aquele concurso. Vencê-lo será mais uma das minhas decepções. Qual o quê! É muita pretensão. Tudo delírio meu! Não vai acontecer de jeito nenhum. Minha obrinha estará a salvo, vão ver só! Filho feio é o do outro, mané!

Sábado, 31 de maio de 2008.

Dbadini
Enviado por Dbadini em 10/07/2009
Código do texto: T1692909