ACREDITE SE QUISER

Creio que, especialmente nas Minas Gerais e de resto, por este país a fora, não existe cidade de moradores tão espontâneos, criativos e que adoram contar uma estória como os de minha cidade natal. Não dá pra se saber se todas são imaginárias, parcialmente reais, totalmente inverídicas ou a mais perfeita expressão da verdade. Acho que, pelo menos, o mote que as originam é sempre verdadeiro. Os babados e alguns sórdidos detalhes ou nem tanto são acrescentados no relatar. Para mim, tudo faz sentido.

Dentre as mais inusitadas, lembra-me a de um senhor, homem trabalhador, pessoa muito simples, o qual, não sei por quais vias, descobriu que sua mulher, em companhia de sua filha haviam se desvirtuado e, juntas, aprontavam todas e mais algumas. O que para ele deve ter sido um susto e um drama no princípio, passou a lhe tomar boa parte do tempo, pois ia todos os dias ao encalço das recalcitrantes.

Numa dessas andanças, encontrou-se com meu irmão que ainda era criança, e saiu com essa: “você viu duas doidas passando por aqui, com o cabelo cortado igual ao do capeta?”. Creio que o menino se admirou ao saber que se referia a sua própria esposa e respectiva filha, mas se limitou a sorrir e dizer que não vira ninguém. Bem, "doidas" é questionável, mas o cabelo, para quem nunca viu o capiloto é difícil responder: vai de retro!

Isso se repetiu por anos a fio. O que soubemos é que, quando as encontrava, com a boca na botija, ou em vias de fato, se limitava a praguejar e dizer: “vocês pensam que me enganam? Acha que não sei o que estão fazendo?”

Pronto. Dava meia volta e retomava suas atividades normais de um cidadão pagador de impostos como qualquer outro.

A coisa ficou tão corriqueira, que, por fim, tudo aquilo passou a fazer parte da paisagem normal do lugar, estranho seria se parasse com as caminhadas rotineiras, porque a mulher não parava de trair e a filha de acompanhar.

Não sei o que sucedeu no fim da vida da protagonista-mor e do principal coadjuvante, porque o povo cansou de comentar e não serei eu a queimar a mufa pra dar um final que satisfaça a minha curiosidade e dos que me leem neste instante.

Mas, de tudo, uma reflexão me ficou: quantas vezes, como cidadãos, vivemos a mesma situação desse homem, quando sabemos dos erros e atrocidades patrocinadas por alguns de nossos políticos e certos homens da lei e temos que nos limitar a engolir e dizer: “vocês pensam que não sei o que estão fazendo?” E retomamos a rotina como se nada tivesse acontecido.