Relatos sobre uma morena clara
Escureceu e clareou o tom de sua pele conforme o sol impunha e ela deixava... Não se cobria tanto assim por achar que há pudor onde não deve neste mundo tão injusto e despudorado quando não deveria ser... Protestava assim: quase seminua, para dizer-se moderna e defensora de direitos humanos, contra preconceitos e discriminações e a favor da justiça e do papo reto... Mas não sabe se por instinto ou por absorção das imposições sociais, cultivou em si muitos bloqueios: às vezes era modesta além da conta, às vezes diminuía seu talento e sua beleza rara à poeira comum por medo e por falta de noção. Era contra os padrões de beleza e massificação de hábitos e escolhas, mas para não se sentir uma extraterrestre se comparava a parâmetros falíveis para se humilhar mais e mais, inutilmente. Algumas vezes se arriscara defendendo o meio ambiente e os animais de forma prática. Convenceu algumas pessoas a cerca de seus ideais, mas não resistiu à tentação de desistir em meio a tantas vaias e críticas. Deveria saber disso, e sabia de muitas coisas. Mas não sentia o próprio estudo e o próprio saber. Por quê? Imaturidade? Falta de apoio. Fraqueza? Burrice!
Ela está crescendo, tingiu os cabelos de vermelho; diziam. Mas a verdade é que ela não sabia bem o que queria, e não queria ainda o que sabia... Ela se adapta facilmente a muitas coisas, não reclama, mas não percebe os perigos tanto assim. Tem muitos amigos e pseudo-amigos, os quais ela não sabe distinguir. Eis mais um de seus defeitos: sabe aconselhar muito bem os outros e viver a vida alheia como ninguém! Mas não sabe tomar muitas decisões e se concentrar em seus projetos.
Trabalha bem, pensa que namora bem e já pensou em abrir uma agência de relacionamentos. Aliás, ela é ótima para ajudar as outras pessoas! Devia fazer mais, diz para si. Não devia! Deve! Na realidade ela ainda assim faz muito pouco e precisa desenvolver sua inteligência, aumentar a sua memória e não deixar tantas coisas em sua vida sustentadas pela negligência.
E o fogo que ia dos ombros até o topo da cabeça, se esvai pra dentro de si ao primeiro sussurro e ao primeiro contato com o amado... O fogo passa não se sabe mais por onde e repousa em outras partes. Ela achava isso tão sujo. Depois achava que era algo a ser feito mesmo, por protesto e por defesa a métodos eficazes para o corpo e não tanto para a mente... Depois voltou a ter pudor, e hoje já acha o sexo quase normal. Viu que o fogo faz parte e não leva nada além de fluidos de seu corpo magro. E viu que a abstinência lhe fez muito bem por todos os anos anteriores, pois hoje encara certas coisas como algo sublime que não sustenta, mas são sustentadas por aquilo que se chama “amor”.