DESPEDIDAS

Acho que nossas glândulas lacrimais dilatam-se com a idade. Até pouco tempo eu me emocionava menos com os acontecimentos. Hoje em dia minhas lágrimas escorrem, mesmo que disfarçadamente, até com finais de novelas. Este mês minhas glândulas lacrimais teimaram em me desobedecer e abriram-se em local impróprio e por causa de uma cena bem corriqueira: despedidas de alunos no final de ano letivo. Aquelas mesmas cenas de abraços, um aluno assinando e escrevendo mensagem na camisa do outro. Seria mais uma cena corriqueira, se isso não tivesse ocorrido com a minha filha de sete anos despedindo-se da turma do colégio dela. Mais uma despedida, a terceira só de turminhas. A primeira foi por motivo de mudança de bairro, a segunda por término do ABC e a necessidade de ir para uma escola maior e a terceira por motivo de mudança de cidade. Eu fiquei olhando ela se abraçando com as amiguinhas, chorando, correndo, rindo e fiquei pensando: se ela com sete anos, já está na terceira despedida, imagine nós que já passamos dos 20, 30, 40, 50, 80 anos. Por quantas despedidas nós já passamos sem nem ao menos imaginar que estávamos nos despedindo de algo. Ou você percebeu quando estava se despedindo de suas bonecas, de seus carrinhos? Você se lembra do momento em que sua mãe ou seu pai parou de cantar ou contar história para você dormir? Será que você já parou para pensar quantos “até logo”, quantos “tchau” deu, quando na verdade era um “adeus”? Você já parou para pensar quantos rostos que você pensava que ficariam para sempre em nossas memórias, hoje estão esquecidos? Quantos apertos de mãos foram os últimos, quantos abraços despretensiosos significaram um “até nunca mais”. Quantos melhores amigos passaram em nossas vidas. Quantas professoras, quantos colegas de escola de trabalho e até mesmos chefes passaram por nós. Até nossos programas de televisão preferidos vão embora sem se despedir, sem dizer um até breve. Programas, diversões preferidas teimam em ir embora sem avisar, eu pelo menos já tive vários lazeres preferidos que vão mudando, sem que nem eu perceba ou me despeça deles: um dos primeiros era jogar bola no final da tarde, mas aos pouco tudo foi sumindo, amigos crescendo, amigos se mudando, até o campinho de areia foi embora e veio para o lugar dele casas, sem ao menos pedir licença; o esconde-esconde e o pega-pega também fugiram, foram embora, esconderam-se para sempre e ninguém conseguiu mais pegar. Do lugar da areia batida, das mangueiras e cajueiros vieram o asfalto, os postes, os carros que passam velozes pela rua, esses teimam em não querer se despedir. Outra diversão que foi embora sem se despedir foi o namoro atrás da igreja, as festas de matinê, as conversas nas calçadas até de madrugada. Quantos lugares já ficaram para trás. Quantas pessoas passaram por nossas vidas e não nos despedimos delas ou então quando nos despedimos não fazemos como elas mereciam. Mas talvez isso seja bom, porquê se tivéssemos consciência que muitos momentos seriam um “adeus” e não um até logo sofreríamos muito mais. Mas agora vou ter mais cuidado em dá um até logo, vou apertar a mão mais firme, vou dá um abraço mais forte, quem sabe esse até breve não seja um “adeus”. Ainda bem que pelo menos as nossas músicas preferidas ainda resistem e de vez em quando tocam em alguma rádio ou são lançadas em CD do tipo “Grandes Momentos” e nunca nos dão adeus.