Um bom homem

Acordei às 1:13 da madrugada. Dormi às 22:34 e acordei esse horário sem saber o motivo.

Incomum, como o dia deverá ser.

Fico pensando o que devo saber sobre sociologia da educação. Sou um péssimo aluno, mas me preocupo com que estudo.

Não gosto de ler o que me obrigam. Creio que a cada semestre leio 1 mil páginas, porém, nenhuma se mantém em minha cabeça.

Literatura é meu assunto preferido. Saber sobre Formalistas Russo, Crítica Marxista, Estruturalista, Estilística, entre outros são meus assuntos preferidos.

Mas sou um crítico sem a crítica. Critico no vazio: obras que não li.

“O Processo” de Kafk, mal sei o que fala. “Don Quixote”, não li uma página.

Sou pobre no objeto e pobre de memória.

As leituras que me tocam são aquelas que nunca terão importância.

Eu insisto ainda em Jack London. Socialista, nômade, levado pela vida da desgraça e miséria. Viajou por mares, conheceu “costas”, passou frio e calor, trabalhou e não descansou, escreveu, leu, largou a faculdade, virou autodidata, escreveu obras com uma imaginação que só quem viveu o que ele viveu poderia fabricar um imaginário tão vasto e coerente com seu pensamento. “Vagabundo”, morador de rua, passou fome e mendigou. Ganhou dinheiro, perdeu. Casou, separou. Amou, desamou. Racista: sim! Hipócrita: Não!

Matou-se. Morreu pateticamente: alcoólatra e miserável aos 40 anos de idade.

O homem torna-se um marco para o reconhecimento pela sua morte, não pela sua vida. Queria um dia descrever a vida de London. Um dia quem sabe. E saber que a vida está lá fora. Do outro lado da parede de concreto, atravessando os concretos urbanos, empurrando pessoas e desabando no mar da natureza ou no mar da desgraça social.

O sono não vêm, então tomo mais um comprimido.

São 4:07 e cedo terei compromisso. Estarei cansado para mais um dia. Provavelmente o café irá me acordar.

As pessoas irão me fazer perguntas, irei respondê-las com frases otimistas. Irei deixar prevalecer a calma do controle em suas cabeças. Manterei tudo em ordem para elas, não para mim.

Meus chefes estarão tranqüilos com seus trabalhos feitos por mim. Suas responsabilidades cumpridas por mim. Seus altos salários ganhos por mim.

A maior parte dos chefes que já tive não dão a mínima para o serviço feito. É como se caíssem em suas mesas belos relatórios com gráficos, conclusões, explicações e análises do nada. Surgissem como num golpe de mágica. Eles repassam para seus superiores e tomam café. Enquanto eu penso o que uma .45 pode fazer na cabeça desse safado.

O mundo do escritório é assim: idiotas ganhando fortunas com seus carros parados em Romanza, Café Photo, Conection; com suas esposas em casa caindo aos pedaços, dedicadas e boas pessoas, esperando seus maridos sujos pela vergonha e traição. Bon Vivant.

Eu sinto cheiro da falsidade, da maldade, do “eu faço algo errado”.

Vamos lá, critique-me pelos meus exessos. Não tenha a coragem. Num território decadente minha justificativa é válida.

Os homens carregam um ar da pobreza interna, preenchidas pelo gozo de mulheres entupidas de drogas, luxúrias, ambições e mentiras. E suas esposas choram.

Entretanto, a traição não é o único meio de contar as vidas femininas perdidas e os filhos abandonados.

A indiferença como orgulho, o egoísmo depressivo, a morbidez irradiada fere a alma de quem está ao lado. A vida deve ser vivida, não lamentada ou repensada nostalgicamente. O desprezo é o tiro na alma. O descaso é a arma para os fracos.

Na vida a gente pode ser esses dois erros: pérfidos ou/e negligentes. E são esses erros que irão assombrar a consciência de quem passa por eles. As pessoas erram e descobrem depois; logo, é tarde, e de Bon Vivant ou desapercebidos vão para Bom Voyage e solidão, para o nunca mais retornar e para o sempre estar se repetindo. Os erros vibrando incessantemente na cabeça a cada passo, agarrando as costas e fazendo pesar até os últimos dias.

Traidores, falsos e maus caráteres; egoístas, frios e insensíveis; punidos pela consciência eternamente.

Fruto não mais do social, mas de si mesmos. Responsáveis pelos seus atos. Culpados de seus erros.

Jack London inverteu o quadro. Sua desgraça é ser um bom homem, seu peso na consciência foi carregar os maus atos de terceiros, sua morte foi o desespero de viver num mundo dominado pela realidade que não podia agüentar. Sua imaginação é efeito da fuga.

Para alguns, um homem é reconhecido em sua morte, mas para mim, um homem é reconhecido em sua vida.

Plínio Platus
Enviado por Plínio Platus em 01/09/2009
Reeditado em 16/06/2010
Código do texto: T1785941