O Cajueiro

Quando eu tinha meus 5, 6 anos morava em uma casa onde o quintal não tinha muro, naquele tempo podíamos nos dá o luxo de não viver presos entre grades e muros. Morava num bairro simples, rua de terra, muitas árvores, mato, um córrego que passava atrás do quintal da minha casa.

Apesar de morar numa capital, até os meus 8, 9 anos nosso bairro não conhecia o progresso (ainda bem). Parecia mais uma cidade do interior com a tranqüilidade de apenas 9 casas no quarteirão, pessoas conversando na calçada, jardins cheios de grama, flores. A pitangueira do jardim da minha avó. O trem que passava próximo a minha casa e que mesmo contra ordens dos pais, teimávamos em correr atrás dele para tentar pegar carona ou então simplesmente jogar pedra quando ele passava muito rápido.

A vida de moleque naquela época era mais simples, escola de manhã e a tarde jogar bola de pés descalço no campo de areia, soltar arraia (Para quem não sabe o que é, é a mesma pipa), jogar pião, colocar cachorros para brigar, no começo da noite tomar aquele banho de meia-tigela, jantar e correr para a rua de novo para brincar de pega-pega, esconde-esconde, cai-no-poço para tentar um beijinho da menina mais bonita, brigar com a turma da outra rua, voltar para a casa e dormir, muitas vezes sem nem lavar os pés.

Mas entre essa infância normal em que viveram quase todos aqueles que foram crianças nos anos 70, algo me marca até hoje. È um cajueiro, esse cajueiro ficava nos fundos de uma casa, hoje eu sei que não distante nem 100 metros da casa onde eu morava, mas naquela época para mim essa distancia era quilométrica, infinita. Esse cajueiro era um desafio para mim, eu sonhava em ir até a ele. Não dando a volta na rua e entrando pela frente da casa onde ele ficava. Mas sim pelo fundo da minha casa, passando pelo córrego e pelo mato até chegar nele. Eu ficava sentado em outro cajueiro que tinha no meu quintal hipnotizado pelo aquela árvore que estava “tão longe” de mim. Ele era imponente, grande, nem lembro como eram seus cajus, mas o que me fascinava nele é que ele se destacava naquela paisagem, por muito tempo foi minha rotina às tardes ficar ali, dizendo a mim mesmo que no outro dia iria lá e sempre adiando, acabei nunca chegando a esse cajueiro. Nem lembro o dia que deixei de admirá-lo ou quando foi cortado. Foi um sonho que estava bem perto de mim e não realizei, como muitos outros que tive em minha vida.

Quantos cajueiros não temos em nossas vidas: sonhos, vontades, fantasias, desejos que estão tão próximos de nós e que deixamos de alcançá-los, conquistá-los por medo, por receios, por desinteresse. Às vezes esses cajueiros que parecem tão difíceis, tão inatingíveis estão ali parados, esperando apenas uma ação nossa para que possamos alcança-los, mas teimamos em adiar, em deixar para manhã e amanhã talvez o cajueiro não esteja mais lá.