O TIÚ QUE COMEU O INDEZ

Era mais uma manhã de seguir galinha para descobrir o lugar dos ovos e a galinha carijó parecia desconfiada e não corria afoita para o ninho, como de costume. Era um tal cisca daqui, disfarça dali e o tempo seguia passando.

Foi aí que a Arlete cansada de ficar escondida atrás das moitas de colonião para ver aonde ia a bendita ave, teve uma grande surpresa.

Era um barulho diferente. Aguçou os ouvidos e por entre o capim sacudido pelo fresco vento matinal que vinha do rio Perdido, ouviu que o ruído aumentava. Levantou-se bem devagarinho e viu um lagarto tiú se lambendo deliciosamente. Tinha mais ou menos um metro e meio de comprimento. A guria chegou mais perto e viu que o bicho estava no ninho da galinha carijó e já havia comido todos os ovos para a alegria dele e tristeza da Severina que não teria ovos para fazer o bolo da tarde.

A menina pegou um porrete e partiu para cima do lagarto que nem se mexeu, pois o papo estava enorme de tanto ovo que comera – uns doze, ao todo. Até o indez que deveria ser preservado jazia no papo do teguixin. Os olhos esbugalhados de tanto fastio.

E agora, o quê fazer? Repontar o tiú do ninho de nada adiantaria, pois o pior já havia acontecido. Então, resolveu voltar para a casa.

Contou o fato à Severina que pegou um relho e saiu em disparada em busca do lagarto tiú comedor dos ovos da galinha carijó. Esse lagarto precisa levar uma tumba – disse. Estava indignada, pois os ovos da galinha carijó eram muito especiais e a Severina costumava separar alguns deles para que outra galinha chocasse. Assim, a espécie nunca se extinguiria. E foi ao encontro do comedor de ovo.

Quando chegou ao ninho, depois de pular muita moita de capim, não havia nem rastro do tiú.

Desconfia-se que o papa-ovo atravessara uma pinguela por cima de um couricho e repousava sob o sol matinal enquanto aguardava a digestão.

Mais tarde depois de encerrada a fuzarca com o tiú o Klebi contou que já conhecia o animal, pois este chocava uns trinta ovos em um formigueiro atrás da porteira que dava para o piquete dos cavalos. Fomos verificar o fato e constatamos que os lagartinhos já haviam nascido. Tinham a cabeça verde, o corpo negro e com manchas brancas.

O restante do dia transcorreu normal e quando anoitecia o Klebi nos chamou para ver o lagarto voltando para junto dos filhotes. Chegou por entre uns pés de guanxuma e entrou no formigueiro.

O Klebi aconselhou-nos a voltar para casa, pois já anoitecia e o animal precisava repousar; afinal tivera um dia muito trabalhoso – comendo ovos, correndo de relho e atravessando couricho por cima de pinguela.

Éramos nós e os bichos.

Assim vivia-se às margens do rio Perdido que passava nas fazendas de Jardim, Bonito, Porto Murtinho e Caracol e estávamos nos anos 60.

Vicentina dos Santos Vasques Xavier

Vicentina Vasques
Enviado por Vicentina Vasques em 23/09/2009
Código do texto: T1826847
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