SOBREVIVI AO TREM DA MORTE

Um diário de bordo!

Nada como planejar uma viagem! É hora de arrumar a mala. Leve pouca coisa porque o que você levar terá que carregar durante toda a viagem, dizia o nosso guia. Coloque uma blusa de frio, porque mesmo sendo verão, estaremos em altas altitudes. Um tênis e um chinelo são de extrema importância. Não esqueça o protetor solar e os óculos de sol. Um boné também é sempre interessante. Duas calças e cinco blusinhas estão de bom tamanho. Depois de longos dias planejando e ajeitando tudo, está na hora de partir.

Nossa meta era chegar até Santa Cruz, esta porém não era uma viagem de férias em que tínhamos tudo planejado. A idéia de irmos para a Bolívia surgiu em uma Conferência da Igreja, duas semanas antes da data em que partimos. Foi tudo muito corrido.

A idéia era nos encontrarmos todos em Campo Grande – MS, porque da Conferência todos iriam para suas respectivas casas. Então saíram grupos de várias cidades e todos nos encontramos no terminal rodoviário da capital do Mato Grosso do Sul.

Foi muito divertido encontrar todo o pessoal em Campo Grande, gente de diferentes estados do Brasil, todo mundo muito empolgado com a viagem. Ficamos dois dias em Campo Grande, fomos hospedados por uma família com o coração muito aberto em nos receber. Cozinhamos para mais de quinze pessoas e andamos pelas ruas onde o calor de 40o é corriqueiro. Como foi bom a tarde que soubemos da existência de uma piscina, não teve outra, pulamos de roupa e tudo. Uma outra tarde ficamos “acampados” na frente da ANVISA para que aqueles do grupo que não tinham regularizado sua carteira de vacinação pudessem fazê-lo.

Nossa próxima cidade era Quijarro, alugamos uma van para que agora todos pudessem viajar juntos. Quijarro é uma cidade fronteira do Brasil com a Bolívia.

Não conseguiríamos entrar na Bolívia sem o visto e esse só é dado para aqueles que possuem a carteira de vacinação contra a febre amarela, pelo menos tomada a 10 dias. Alguns de nosso grupo não tinham essa regularização. Para conseguirmos o passe livre, houve o pagamento de uma propina.

Enfim entramos na Bolívia... diante dos meus olhos brotou a cena mais estonteante de todas. Em um segundo, ao cruzar a fronteira, não havia mais iluminação nas vias públicas e nem mesmo asfalto nas ruas. Sim, estávamos na Bolívia.

Não conseguimos comprar o passe para o trem da morte que nos levaria até Santa Cruz, não havia ingressos suficientes. Ficamos mais dois dias em Quijarro, dormindo no chão de uma igrejinha. Andar pelas ruas dessa cidade foi com certeza uma experiência incrível, o que dizer dos açougueiros vendendo suas carnes em céu aberto, sem qualquer tipo de refrigeração! Resolvemos não arriscar um churrasquinho.

Conseguimos!!! As passagens para o trem da morte foram compradas. E agora começou a surgir em nós uma interrogação: porque trem da morte? Será que existe algum perigo nessa viagem? Descobrimos, porém, que o nome nasceu com a própria ferrovia onde milhares de trabalhadores teriam morrido durante a construção por causa da malária, essa, é claro, uma das muitas versões. Viajar de trem é uma experiência inusitada. Nada como abrir bem a janela, colocar os pés pra fora e ficar recebendo aquele ventinho enquanto ouve o barulho dos trilhos e vê a paisagem passar em câmera lenta. Inesquecível!

Mas o melhor da viagem são as paradas. No meio do nada entram na sua cabine um monte de bolivianos gritando: tampico, soda fria limonada, coca (que é a coca-cola, não a folha da cocaína – que também é muito fácil de ser encontrada e aliás, tem um gosto horrível). Não importa a hora que seja: dia, tarde ou madrugada, é o trem parar que eles entram.

A viagem durou em torno de 17 horas e é importante ficar atento contra furtos, porque como já disse, não para de entrar gente, não há como fechar as cabines. Existem banheiros, mas sem papel e com pouca água. Durante a noite algumas vezes as luzes se apagam do nada, é bom ter uma lanterna de sobreaviso. A viagem é bem interessante, inusitada e surpreendente, fácil de se encontrar mochileiros pelo caminho e ótima para fazer amizades, mas creio ser positivo fazê-la em grupo. Nos fizemos escala de quem dormia e de quem ficava acordado. Talvez só apavoramento de turista. Chegamos todos bem e com todas as bagagens.

Santa Cruz de La Sierra é uma das principias cidades da Bolívia, possui uma praça muito bonita e o povo é amigável. Ótimo lugar para comprar roupas por um preço acessível. A comida é diferente mas não passe sem comprar alguma daquelas coisas estranhas que eles vendem na rua, você nunca vai se esquecer, eu garanto!

Nunca se volta igual de uma viagem, ir para um país como a Bolívia foi incrível, me fez rever vários conceitos. E hoje posso afirmar: “sobrevivi ao trem da morte”.