SABEDORIA DE VIVER

Desde pequena, o sofrimento me causa apreensão, para não dizer medo. Aos nove anos de idade, fui interna em um colégio de disciplina rígida. Me rebelei contra as regras, fui castigada e perdi as saídas de fim de semana. Sofri muito com isso. Instintivamente, aprendi que a rebeldia, a raiva e a mágoa causam mais sofrimento em quem a tem, do que a satisfação de ter se vingado de quem o causou. No meu caso, a autoridade que me puniu. Comecei a calcular os riscos de uma atitude de revolta e revide. Com isso, meu temperamento impulsivo conquistou um pavio um pouco mais longo. Não quero dizer que encontrei, como o título acima, a chave da felicidade mas, diminuí, substancialmente, as consequências da intrepidez. Procuro colocar no cemitério das mágoas, das dores, das perdas e das ausências, um gramado verde e, na terra fértil com o adubo dos rancores, plantar sementes que produzirão flores coloridas. Custa menos aplacar a raiva do que cultivar a vingança, que traz situações desconfortáveis, no futuro. Cuido mais do que é meu, da casa, do conforto, prazeres pessoais e dos meus amigos, sem ficar lembrando do que passou.

A memória, grande auxiliar do cérebro e da inteligência, deve ser monitorada para as coisas boas da vida. As músicas de fundo dos momentos especiais, registradas a fogo no nosso coração. A música, assim como os perfumes, nos transportam no tempo e no espaço, e revivemos, quase que com a mesma intensidade, aquele instante precioso. Da mesma forma que inventaram a tecla "delete" no computador, temos de inventar algo parecido com a borracha, que apagava o que estava incorretamente escrito a lápis.

Como todo mundo, eu tive perdas e dores: as mortes de entes queridos, abandonos amorosos, decepções com amigos, fracassos profissionais e dificuldade nos relacionamentos familiares. Mas, não deixei que estas coisas me tornassem uma pessoa amarga, porque sei que a amargura é mais penosa para mim, do que para quem convive comigo. O fel foi dado a Jesus, como um gesto de crueldade, a quem deveria ser castigado pelo crime de ter cutucado as feridas dos poderosos da sua época. Não quero espalhar este mal.

Acho que a minha filosofia de vida, instintiva, só me trouxe benefícios. Estou, aos setenta anos, morando em uma casa (sonho da juventude), na cidade que amo, cercada de verde por todos os lados, com espaço para abrigar todos os meus amigos e familiares. Me comunico, com o mundo, através do computador e do velho telefone. Se necessário, recorro aos correios, para um pacote, que não possa ser remetido em anexo ao e-mail. O carro me ajuda a percorrer distâncias menores e o avião a transpor o oceano.

Quando me mudei para essa casa, tive que esvaziar, literalmente, as minhas gavetas. Aproveitei a oportunidade, para deixar no apartamento onde morava, tudo o que me incomodava e empanaria o meu ambiente futuro. Despoluí meu coração e plantei as sementes do amor. Com a primavera e alguma água, ele está brotando. Transbordo para vocês o meu sentimento, e tenham todos um ótimo dia, de sol e calor, para os que gostam do verão, e chuva, neve e frio para os outros (como eu).

Gilda Porto
Enviado por Gilda Porto em 04/11/2009
Código do texto: T1904415
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