ENVERGONHADO COM O HOMEM, ATÉ O DIABO CHORA...

Barcelona, Espanha, um dia de um ano qualquer. É sexta-feira. Homens colocam pesos nas costas de um touro, causando-lhe muitas dores. O peso é quase superior às forças do animal.

É sábado. O touro é levado, ainda com os pesos nas costas, para um recinto escuro e ali deixado, por um dia inteiro, sem água e sem comida. Administram-lhe laxantes, que lhe causam horríveis diarreias e o deixam desidratado. Seus chifres são serrados, sem anestésico, a sangue frio, de tal forma que dói só de tocar nos ferimentos. Os olhos do animal são besuntados com vaselina, dificultando-lhe a visão.

É domingo. Arena repleta. O touro é solto. Fraco, debilitado, doente e quase sem enxergar. Ali o esperam heroicos seres, assemelhados a espécie humana, uns a pé, outros a cavalo. Lanças são espetadas nas costas do touro, perfurando-o até os pulmões, que se enchem de sangue e dificultam a respiração. As perfurações continuam, associadas a pauladas. O sangue jorra pela boca e nariz do animal. Quando o touro não se aguenta mais em pé, surge o super heroico matador para o golpe final. Com o bicho ainda vivo, esse herói corta-lhe a carne e os músculos para retirar os aguilhões (espécie de arpão). As orelhas e a língua, como troféus, são exibidas para a platéia ensandecida, que aplaude, grita "olé" e joga flores para o retardado. O espetáculo termina.

E eu começo. Inicio perguntando: afinal, quem é o animal? O touro ou os imbecís que atacam o bicho, para sua satisfação e humilhação de seres sem a mínima defesa? O que pode trazer de bom matar animais com requintes de crueldade? Por que, em pleno séc.XXI, as pessoas se comportam como se fossem homens das cavernas? Nem isso, porque o brutamontes pré-histórico matava para saciar necessidades básicas. A tourada lembra mais os espetáculos do Império Romano, quando a população se deliciava vendo leões comerem os primeiros cristãos. A tourada é prática antiga. Remonta a mais ou menos 2.700 A.C., na Grécia, e hoje se perpetua em lugares da Espanha, Portugal, México e outros.

Por que aceitamos isso? Por que continuam a existir esses espetáculos dantescos? Como é que pessoas, seres providos de inteligência e sentimento, podem aplaudir e se divertir com essa crueldade? Porque, como sempre, o ser humano prioriza o lucro, em detrimento do coração. Poderosos lobbies são os que mantém as touradas, com apoio dos governos e das empresas. E a esses fatores, pasmem, aliam-se causas beneficientes! Sim, para angariar fundos às crianças do Terceiro Mundo, para ajudar nas doenças incuráveis. A própria Igreja Católica permite (ou se omite) touradas em honra a seus santos.

Que o ser humano é capaz de selvageria e atrocidade, isso todo mundo sabe. Que o ser humano é o único animal que mata por prazer, todo mundo também sabe. O que eu duvido muito é que homens que se prestam a causar sofrimento a outros seres, sejam portadores de sentimento ou de um mínimo de inteligência. Por isso, torço sempre pelo touro. Mas, infelizmente, a luta é desigual e ele sempre perde.

Barcelona é a única cidade espanhola em atividade. Catalunha, região separatista da Espanha, estuda uma lei´para proibir as touradas. Pensa-se num plebiscito popular. Assim, a "corrida" de 27 de Setembro _ termo que se refere a uma tarde com três matadores e seus touros _ foi mais que simplesmente o fim de uma era. José Tomás Roman Martin, ídolo das touradas aposentado aos 27 anos, em 2002, retornou depois de cinco anos, para delírio dos fãs, no Plaza Monumental, em Barcelona, como uma última tentativa de apelo à bilheteria e para emprestar seu talento contra a proibição. Estádio lotado, com 19.000 pessoas.

Com um herói desses, quem precisa do Diabo?

Giustina
Enviado por Giustina em 10/11/2009
Reeditado em 06/01/2014
Código do texto: T1916512
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