Gambás órfãos
Já era noite e após o jantar novamente ouvimos um barulho já conhecido da noite anterior. Era um chiado estranho, e começamos com os palpites, antes de verificar o dono da grotesca sonoridade.
-Um grilo?
-Não
-Um pássaro?
-Também acho que não
-Uma cobra?
...Silêncio...
-Uma cobra??
...Risos...
-Uai, pode ser... uma cobra?!
...Extensas gargalhadas...
-Mas não estou brincando! -depois de pensar mais um pouco já com inúmeras interrogações-Uma cobra????
...Engasgadas e estridentes gargalhadas...
-Mas é claro que não pode ser uma cobra!
Deixamos o caso pra lá, pois afinal o único animal em questão era a galinha que morreu naquela tarde,devido ao ataque de um gambá na noite de sábado.
Os pobres franguinhos órfãos e o galo viúvo ficaram toda a tarde numa orquestra desafinada, lamentando o cadáver numa lamuriosa e estridente valsa da despedida -quero dizer- piadas da despedida.
Porém o barulho não cessou e fomos verificar de onde vinha.
Mais palpites...
-Da varanda?
-Talvez
-Do pé de pitanga?
-Acho que não
-Da garagem?
-Sim... parece vir de lá!
A voz ativa da casa vai verificar e me chama para ver o que encontrou:
-Olha! Venha ver! Um rato!
-Rato?! E o que te faz pensar que eu irei aí ver um rato???
-Ah, é bonitinho... venha ver...
-Nem pensar! e amanha tratem de consumir essas galinhas, pois provavelmente o rato foi atraído pelo milho e os restos de comida que elas deixam no quintal!
-"Peraí"! Isso nao é um rato!
-É o que entao?
Nao É, porque É está no singular, SÃO filhotes de gambá! Tem vários na garagem e na varanda!
E pra nossa surpresa tinha um na sala também!
O "cabeça da casa" foi procurar algo para matar os bichinhos.
Eu propus que pegássemos uma caixa de papelão, recolhêssemos os filhotes e jogássemos no meio do mato pra eles se virarem, e que não seria necessário matá-los!
Mas depressa me disseram que como na noite de sábado mataram a mãe dos filhotinhos, eles morreriam de fome de qualquer jeito, então era melhor matá-los com uma paulada certeira.
Em silêncio me retirei, e ao tentar voltar a leitura que ocupava minha noite antes dos ruídos, comecei a pensar sobre o fim dos gambazinhos e notei que a conclusão que eles tiveram não se aplica somente aos pequenos mamíferos com cara de ratinhos. Quem o diga a Lagoa da Pampulha, os banheiros e lixeiras que já receberam fetos e recém-nascidos, que foram deixados lá pelo mesmo motivo.
"Não teriam o que comer quando crescessem!" alegam as mulheres que geraram as crianças, e por esse motivo largam os pequenos mamíferos á sorte dos braços do vento da morte, que levará suas almas ao descanso da vida que conheceram por alguns instantes.
Pensando nisso, ouvi as pauladas e depois as risadas pelo ato "heróico" do meu pai em matar quatro "ratinhos" que correram em vão,do cabo da enxada que esmagou suas pequenas cabeças.