O Exame em Três Atos

Lá estava eu, no primeiro ato, no laboratório. Embora o laboratório fazia vários tipos de exames, eu tinha certeza que todas as pessoas estavam lá pelo mesmo motivo. Portanto, todos sabiam o que eu faria lá.

Aguardei até que não houvesse mais ninguém para ser atendido. Levantei-me e fui. No instante em que alcancei a atendente, uma moça chegou e ficou bem atrás de mim, em fila. Eu, muito gentil, quis lhe dar prioridade. A moça agradeceu. Insisti. A atendente parecia impaciente. A moça recusou com um sorriso. Ah, o sorrisinho maroto. Em todas elas. Aliás, o que todas aquelas mulheres estavam fazendo lá?

Não teve jeito. Fui atendido antes. A atendente estava a ponto de demonstrar toda a sua impaciência. Aproximei-me dela. Senti o sorrisinho. Embora todos já sabiam porque eu estava lá, falei baixinho, quase no seu ouvido:

- Vim fazer esse exame.

- Deixa-me ver... ah, sim, espermograma.

Putz! O som retumbou na sala. Es-per-mo-gra-ma. Sem vergonha. Precisava falar? Não podia somente ter lido na requisição? Agora, de todos os pacientes, eu era o astro principal. Manchete. Explícito. Estava lá para fazer o tal espermograma. Com todas as sílabas e todas as implicações. Fazer o espermograma é, de fato, uma situação bastante embaraçosa. Afinal, todos sabem o que o sujeito está fazendo atrás da porta da temerosa salinha.

- O senhor quer fazer a coleta aqui ou em casa?

E agora? Fez-se um total silêncio nos sorrisinhos. Suspense. Qual seria a minha decisão? Podia fazer ali mesmo e terminar a agonia. Mesmo sabendo que todos o estariam escutando atrás da porta da salinha. Ou levar o pote para casa. Com todos imaginando o que eu iria fazer em casa. Depois, voltar para entregar a coleta e passar pelo mesmo sufoco. Pensei por um instante. Suava. A moça da fila parecia se debruçar sobre meu ombro para acompanhar o desfecho. Antes do suor pingar sobre a requisição, decidi:

- Vou fazer em casa.

Ainda não estava preparado. Melhor ganhar um tempo para o ato seguinte. Escutei as instruções, quase tentando sufocar a atendente. Mulher sem vergonha. Precisava repetir tantas vezes espermograma? E coleta do material, então? Será que as orientações precisavam ser tão redundantes com relação à coleta do material? Enfim, peguei o pote e sai cabisbaixo.

O segundo ato foi mais introspectivo. Eu e o pote. Enorme. Para que um pote tão grande? Se encher, vão perceber que a coleta do material fora fraudada. Ou será que não? Será que alguém enche o pote? Se for pouco, já imaginava a atendente sem vergonha examinando o pote diante de todas. Cheias de sorrisinhos. Girando-o e girando-o contra a luz a fim de verificar se a coleta do material havia sido satisfatória.

Havia dois problemas: a entrega ao pote e a entrega do pote. Precisava de uma estratégia.

Levei uma semana somente para criar uma intimidade com o pote. Afinal, nunca havia feito isso. Não com um pote. Seria um momento. Efêmero, mas marcante. Quiçá único em toda minha vida. Havia de me preparar. O pote merecia.

Preparei o ambiente. Nada muito romântico, nem vulgar. Olhei o pote. Nem curvas tinha. Cilíndrico. A tampa, sem charme nenhum. Deu o maior trabalho convencê-la a se abrir. Poxa! Quase joguei na cara dela que estava pagando por aquilo tudo. Mas não, com jeito eu a fiz se entregar.

Com muita imaginação consumei o ato. Fechei o pote. Olhei-o contra a luz pensando na atendente. Será que tem o suficiente? E o aspecto, está de acordo? Não tinha nenhuma referência. Só de alguns filmes. Sempre achei que naqueles filmes havia sacanagem. Sacumé, jogo de luz, lentes de aumento, tratamento de imagens. Não era uma boa referência. Enfim, tinha que levar o pote. A ordem era clara: o pote com a coleta do material deve ser entregue em até meia hora após a coleta do material.

Parti, enfim, para o ato final.

No caminho pensei como faria. Mentalizei todo o ambiente; os sorrisinhos da platéia. Sorte minha se algum outro estivesse fazendo o tal exame. Aí, todos estariam atrás da porta da salinha escutando. Seria muita sorte. Chegar de mansinho não seria possível. A atendente se encarregaria de fazer as honras da apresentação. O negócio seria causar impacto mesmo. Desarmar o sorrisinho de cada uma que estivesse lá para assistir. Isso; surpreender. Fazer o inesperado. Marcar para sempre.

Cheguei no laboratório. Observei da porta. Cheio de sorrisinhos. A atendente estava livre. Respirei e fui a passos firmes. Saquei o pote e coloquei-o sobre a mesa tal como se faz após virar um copo de tequila. Bradei:

- Trouxe aqui essa porra para a análise!

Depois, virei-me para a platéia e fiz aquele gesto de curvar-se em agradecimento. Tal como um grande ator ao final do espetáculo. Depois, saí de cena. Afinal, não aconteceu comigo. Foi com o Nário, meu amigo. Diz ele que é a verdade... sei lá.