Crônica esportiva

Em xadrez é bem verdade que aprendemos convivência com o sucesso transitório nos avanços de meio-jogo, nas retiradas dos lances finais, gozando momentos brilhantes; todavia um erro fatal, rápido, acabará por colocar o ilusório vencedor em derrocada. Há casos curiosos de erros onde temos clareza do que não devemos fazer e, no entanto, cometemos o lance que acabamos de julgar absurdo. A idéia de que empregamos toda a inteligência e dela resultou o fracasso leva muitos iniciantes ao abandono da prática. Esse sofrimento consiste muitas vezes no fato de não se alcançar mentalmente através da intuição um caminho sólido para sublimação dos nossos erros. Como se no mundo existisse mais leis e regras do que propriamente caminhos. Observamos então que sem os registros dos lances, (reinício da escrita no processo mental do adulto) na maioria dos casos o que persiste, é certa arrogância em depositar na memória todos os momentos que levaram a derrocada. É o sofrido xeque-mate. Porém é nesse exame minucioso que se esteia a melhoria da qualidade, o progresso mental, até surtir a plena evolução. A experiência com múltiplos parceiros é essencial.

Conheço jogadores que se recusam com veemência ao estudo das aberturas, recusam as explicações elaboradas pelos grandes mestres, hoje facilmente disponível. Li certa vez um relato de experiente jogador onde se referia a transição de jogador intuitivo para o jogador técnico. Aquele que estuda abertura e finalização, pois o meio-jogo é repleto de mistério. A dura tarefa de praticar esse conhecimento leva-nos a desastrosas derrotas, oriundas da prática inexperiente frente a experimentados adversários. O fruto amargo da experimentação deverá mesclar com o tempo e a paciência, habilidade e memória. Porém a bagagem emocional, firme, estruturada produz maior vigor, maior inteligência estética sobre a arte da construção lógica em cada partida.

Cada partida é para o sagaz observador professor da própria sagacidade. Situações épicas, repletas de dramaturgia humana somente vivida de antemão através dos grandes clássicos literários. Tudo isto disponível num único e singular evento de xadrez onde a análise se torna inesgotável. Avanços, retiradas, exílios até a final pacificação proposta pelo gentil aperto de mão. É a primeira fase de reeducação a que nos entregamos na vida adulta. O único momento em que um adulto pode ser novamente repreendido com a máxima: olhe com olhos, nunca olhe com as mãos. Peça tocada, peça jogada. O efeito é maravilhoso. Ou ainda a permissão para retificar, nas partidas livres, para criação de maior complexidade no exercício amistoso de cada situação. Aprender a exercitar xadrez é simplesmente uma fortuna. Sem contar a máxima do grande poeta Gregório de Mattos Guerra: “Sempre és certeza, nunca desengano...” Ah! O ser cuidadoso com as verdades imediatas e os conceitos rápidos. Já Machado de Assis via no xadrez uma anarquia reinante e paralela ao contexto da polis livre: peão captura rei, bispo captura rainha, etc. Faceta genial de humor do mestre literário. Acredito que Capitu tem forte influência de estilo semelhante ao mistério do meio-jogo em xadrez.

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