Meu vulcão não dorme, cochila

Remexer textos é remexer gavetas. Selecionar o que é útil, o que será descartado, o que ficará aguardando um tempinho esperando o momento certo de ser usado. Foi isso que fiz com meus textos essa semana. Reli muitos deles, ri, chorei, me perguntei se tinha sido eu mesma que tinha escrito alguns e acabei me animando a desejando produzir outros.

Li textos iniciados e largados, deletei alguns porque achei que não tinham futuro, outros porque estavam ruins mesmo. Encontrei títulos com textos em branco suplicando para serem preenchidos, resquícios de poemas construídos e destruídos por mim tendo como sobras seus ossos pensando que um dia poderiam ser novamente restituído de músculos, nervos e sangue e serem ressuscitados.

Estanque, era assim que estava me sentindo por produzir pouco ou nada. Então vi que textos não são só parecidos com gavetas mas também com vulcões.

Período estanque é como um vulcão adormecido. Eu pensando que as palavras escapam de mim e me deixam vazia e carente delas, descubro que me cercam o tempo todo. Meu vulcão não dorme, cochila. E cada cochilo é um descanso para outra erupção, muitas vezes violentas e avassaladoras. Jorram como lava e alertam que não adianta prende-las, o que não é ruim, apesar de ser doloroso, afinal sufocar palavras é como abafar um vulcão, impossível. Mais dia menos dia elas acabam eclodindo sua lava embriagante. Tomam mente, alma e embriagam o corpo, não há como fugir.

Saí dos meus textos e adentrei por palavras alheias bebendo das lavas de outros vulcões. Acabei descobrindo que algumas vezes agente só lê e outras agente bebe. Eu andava lendo muito, creio que só olhando para as palavras mas sem ingeri-las. Estava em abstinência poética. Ler me concede a compreensão de que cada escritor tem a sua maneira de lidar com as palavras. A luta de cada um é individual e única, mas as palavras parecem que têm vida própria e que formam uma rede de intercomunicação. Conspiram entre si e agem no momento certo quando querem bulir com o leitor. Buliram comigo, bolem sempre comigo e eu finjo que não dou atenção, faço de conta que me afasto delas, como se fosse possível driblá-las.

Por sorte depois do vulcão mexido me embriaguei. Um verdadeiro inebriamento poético.

Silvia Pina
Enviado por Silvia Pina em 21/03/2010
Código do texto: T2151440
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