Em plena Floresta Amazônica

Como imaginar aos vinte e três anos morar em uma casa a 100m da floresta amazônica?

Por mais que a imaginação fosse fértil é muito difícil sair de uma São Paulo- A Megalópole- e aterrizar literalmente em plena mata.

Assim foi...

Chegada muito interessante. Não havia aeroporto, apenas uma porta tipo filme de "bang- bang" que separava o lado de dentro do aeroporto e o lado de fora.. Não estou exagerando.Isso tudo data de 1970. Hoje, provavelmente, deve ter um bom aeroporto.Imagino. Nunca mais tive oportunidade de voltar lá.

O caminho para a nova casa era curioso e preocupante. Uma boa parte da população regional morava em palafitas. Palafitas? Nunca tinha tido anteriormente oportunidade de vê-las, a não ser em livros de estudo. E a minha casa, como seria? Confesso, durante o caminho e até chegar no local exato, estava meio ressabiada. "Lugar da mulher é ao lado do marido", portanto, lá estava eu, porém, insegura. Cansada da viagem, quase 15 horas desde a partida, ainda saudosa da família, dos que ficaram, mas louca para conhecer meu novo Lar.

Durante o voo eu já havia tido a oportunidade de ver uma clareira no meio da floresta gigante com uma pequena cidadela . Era de arrepiar a grandeza da “nossa” Amazônia e as casinhas lá embaixo...

A chegada no núcleo (assim era denominado) me encantou. Um verdadeiro “presépio” no meio da floresta. Tudo muito limpo, casas iguais a depender do grau de trabalho do marido. A nossa, tinha a porta amarela e era a última da rua antes de começar realmente a grande mata. Incrível!

Uma ajudante já estava contratada à minha espera. Adorei! Afinal, estava começando tudo. Vida nova, local novo, adaptação aos costumes, nunca havia cozinhado (sempre trabalhei fora) e tantas coisas mais. A jovem, logo na minha chegada, me pediu umas “cruzetas para agasalhar a roupa”. Não entendi. Cruzetas? Agasalhar roupas? Êta Brasil! Seu regionalismo é muito interessante.

Cruzetas, para quem não é da região e nunca ouviu falar é cabide, e agasalhar a roupa é guardá-la no guarda -roupa ou armário. E, assim foi... A cada dia uma nova palavra ou termo regional era absorvido por mim. Depois de uns meses eu já me sentia da região.

Lá, chove todos os dias em uma determinada época do ano. . Sempre na mesma hora. O barulho é forte e ela vai chegando pesada através da mata. Quando chega, vem pra valer! Assim como vem, vai embora. Minutos depois, ninguém diz que choveu.

Momentos de rara beleza podiam ser observados cotidianamente. Ao entardecer as araras e periquitos vinham voando em bandos para nossa vila, eles atravessavam a ilha de Marajó. Muitas vezes eles voavam muito baixo e batiam nas paredes das casas , caindo machucados. O dó!

Entrando um pouco floresta adentro, e isso eu fiz muitas vezes, eram milhares de borboletas amarelas, lindas, mais muitas mesmo. E os macacos? Lá o que tinha muito eram macacos de porte médio, cor avermelhada e andavam em bandos.Guaribas.

No começo eu me assustava muito. O barulho que eles fazem é bem alto. Certa vez chegaram bem perto de casa, já nos haviam ensinado bater tampas de panelas ,o barulho os afasta. Isso acontecia de fato. Eles se afastavam, voltando para seu habitat.

Boas lembranças! Quanto cresci com essa experiência. Quanto a vida foi me mostrando, comecei a olhar o mundo sob outros ângulos.Quando brotam essas lembranças na memória , surge a pergunta.:

- Valeu sair de perto da família para tão longe? Arriscaria novamente?

Resposta:

- Tudo vale a pena. A vida vale a pena. Novas experiências nos fortalecem, enriquecemos a nossa essência. .

Ouvi do meu pai, e já tive oportunidade de escrever sobre isso. “Depois do casamento o marido é a nova família e, acompanhá-lo, é obrigação da mulher”. Não foi obrigação, foi um prazer.Fomos muito felizes nesse lugar. Chegamos lá um casal e voltamos uma família.Os momentos inesquecíveis guardamos para sempre e com muito carinho no fundo da nossa alma.