MINEIRINHO FAROFEIRO

Faz algum tempo, de cada dois ônibus de turismo que saíam de Bom Despacho – um ia para Guarapari e o outro para Aparecida do Norte. A fim de variar, nas férias de janeiro eu e meus colegas Bosco e Rafa combinamos mudar o itinerário. – Puta merda! Desabafou o Bosco. Em vez de viajar nas jardineiras fretadas pela BD-Turismo, a gente vai num ônibus “gostosão” da Viação Cometa! E pra Cabo Frio!

Durante a viagem, colocando em pratica outra das ideias geniais do Rafa, passamos boa parte do caminho treinando a pronúncia de “carioquês” – mash, vochê, marr... E, naturalmente, esquecendo o “mineirês” – trem bão, uai sô, poRta... Tudo nos mínimos cuidados, para não dar bandeira ao pegar gatinhas na areia, fingindo ser da cidade. Detalhe importante: nada de pousada; nos hospedamos num hotel chique, na Praia do Forte.

No primeiro dia à beira-mar, em seguimento ao plano de viagem alugamos um Dojão conversível, daqueles do tamanho de uma piscina de condomínio e que a cada acelerada bebia três litros de gasolina! Como garantia de acesso liberado ao quarto do hotel à noite - para acompanhantes não registradas -, colocamos um troco no bolso do garagista. Tive que tirar o boné pro Rafa, ele pensara em tudo! Bem, mas é sempre aconselhável ir devagar com o andor, quando o santo é do pau oco. Ao nos aprontarmos para curtir a night, comparecendo à boate mais badalada, descobrimos que só eu levara carteira de habilitação. Aí, não deu outra, os dois sacanas convenceram o gerente do hotel a lhes emprestar uma jaqueta e um boné de recepcionista, e assim me vi promovido a chofer particular deles.

Do estacionamento da Star’s Room – Salão de Estrelas –, este era o nome da casa noturna, ouvindo o som que rolava na pista de dança fiquei com a pulga atrás da orelha. Só dava Queen e Village People, as bandas queridinhas do público gay. E os dois guapos rapazes enfurnados lá dentro... Até que às horas tantas, para me matar de inveja, eles voltaram pro carro, cada qual escorado numa louraça daquelas de para o trânsito da Rua Dr. Miguel Gontijo (a nossa 23 de Março), nas manhãs de sábado! – Toca pro hotel. Foi a ordem que recebi, sentindo bafo de uisque paraguaio às costas.

Assim, enquanto o Rafa e sua beldade subiram para o quarto, o Bosco ficou no banco traseiro do Dojão, dando amassos caprichados no outro monumento. De repente ele soltou um grito desesperado. Num carinho mais íntimo descobrira que sua loura era louro. Um travesti! Quando batemos na porta do quarto para alertar o Rafa, ainda tonto ele só resmungo: - Caralho! Eu arrombei pelos fundos...

Cabo Frio... nem ao menos uma arvorezinha solitária fazendo sombra na praia, e o mar de água gelada, própria para pinguim! Ao final quem pagou o maior mico da temporada fui eu, justificando mais uma vez meu odioso apelido de Frango-de-granja. Folgadamente na areia, conferindo com a vista a falta tecidos nos biquinis das mulheres, embasbacado me esqueci do sol, queimando-me tanto que no dia seguinte tivemos os três que embarcar no ônibus, de regresso. Meu corpo ficou todo coberto por borbolhas, parecendo um camarão frito, nem consegui calçar os sapatos. Aí, foi o motorista quem se engraçou comigo, dizendo que era proibido viajar descalço. Depois de muito choro, inclusive tendo que lhe forrar o bolso com meus últimos trocados, o infeliz rosnou: - Embarca logo, mineirinho farofeiro!

dilermando cardoso
Enviado por dilermando cardoso em 17/05/2010
Reeditado em 01/10/2011
Código do texto: T2262555