RETALHOS DA VIDA
RETALHOS DA VIDA
Elizabeth Fonseca
A borboleta marrom, cinzenta e peluda...
que apelidamos até mesmo de ‘bruxa’,
quando entra em nossa casa, logo pegamos
uma vassoura, espanador, e passamos
a escorraçá-la; às vezes, até matando-a,
alegando que é uma bruxa, que traz maus
presságios; as crianças sentem medo,
o pozinho de suas asas é venenoso,
provocando até mesmo a cegueira.
Pois bem; ela toda desajeitada, e
cinzenta, feia, debatendo-se nas vidraças,
tetos, de um, para outro lado
é simplesmente rejeitada.
Por outro lado, uma linda borboleta,
toda colorida, trazendo aos olhos o encanto
de suas asas multicolores,
é adorada, cobiçada, até mesmo para
enfeite de quadros, vitrines, bandejas...
Quando no jardim, assemelha-se a uma
bailarina em pleno espetáculo de arte.
- Não seriam as borboletas marrons ou
cinzentas e ‘bruxas’ os nossos mendigos,
rotos e mal afeiçoados, que andam sempre
à procura de um lugar para se acomodar,
onde a sociedade não deseja tê-los?
- Não seriam as borboletas coloridas,
faceiras, idolatradas, esta nossa sociedade
ostentada, cansada, machucada e quebrada,
que apesar das aparências, leva o fardo pesado
com almofadinha nos ombros para suportar o peso ?
As borboletas coloridas também têm pozinho em
suas asas, mas pouco perceptível. E como saber
se, ocultamente, a situação moral seria igual ou inversa...
Assim como as ‘bruxas’, os nossos mendigos
caminham sem oportunidades nas sarjetas
do mundo, até que os corações abnegados lhes
dêem um pouco de esperança e conforto.
Esses são os nossos retalhos. Nunca será possível
juntá-los à grande peça, sem antes banir os
nossos apegos materiais e o orgulho,
que são verdadeiros espinhos de nossas almas.