UMA LOURA EM MINHA VIDA

Além de você, claro, sei de apenas outros três contumazes leitores destas crônicas. Pois não há de ver que um deles - portanto vinte e cinco por cento do meu fã-clube -, cismou que ultimamente ando rabugento, deixando tal comportamento reflexos imediatos no humor das minhas ideias e palavras, agora impregnadas com insuportável catinga de mofo?

Até concordo, em parte. Muitas vezes, me sinto como verdadeiro dinossauro, perdido numa floresta de modernidades. Mal consigo digitar meus textos ao computador. E, desastrado, como se possuísse sete dedos em cada uma das mãos, a todo instante esbarro na tecla “delete” quando a pretendida era “salvar”. Internet, então, é outro monstro que jamais acessei, embora digam maravilhas a seu respeito. Mesmo um corriqueiro telefone celular me deixa em apuros. Portanto, a conselho, permito hoje aflorar meu lado light - mas sem frescura, que respeito é bom e eu prezo -, na tentativa de ser um pouquinho mais romântico, embora também esta espécie, de tão fora de moda, esteja igualmente com prazo de validade vencido.

Atire a primeira pedra quem nunca fez besteira, com bê maiúsculo, ao descobrir-se apaixonado! Ou jamais pagou um daqueles micos antológicos, bem podendo ser chamado de King Kong e que mesmo passado muito tempo lhe provoca rubor nas faces! Para não parecer que sou dos que apreciam ligar ventilador na farofa alheia, entrego barato uma das mancadas porque até hoje me envergonho e penitencio.

Bem, a estória não é recente, data de quando os rapazes compareciam às festas devidamente calibrados por doses extras de cuba-libre, na cuca. Nem sei se ainda existe esta bebida: rum, gelo, coca-cola e limão! Mas o fato é que, para aumentar a coragem ou por herança genética abusei do citado líquido, num baile, lá pelas tantas cismando com uma louraça tipo avião! Nos dias seguintes, como recomendavam os manuais de conquista, fiz-lhe a corte, isto é: enviei cartinhas perfumadas, ofereci músicas no rádio, mandei uma rosa vermelha; enfim, pratiquei todas as tolices que a idade nos permite, sem maiores constrangimentos.

Como à época me achava meio poeta, a três por dois sapecando versinhos medíocres - mas que a meu ver eram puro engenho e arte -, atrevi-me a imortalizar minha Vera Fisher num poeminha que, salvo engano, terminava com a seguinte estrofe: “Você passou por mim como um beija-flor. Hello! Good bye! Zás!... E eu fiquei me perguntando: porque a felicidade tem que ser assim, tão fugaz?" Para economizar paciência e tempo ao leitor insone, cumpre-me registrar que não caindo na lábia deste conquistadorzinho barato, a musa aplicou-me tão formidável pé-na-bunda que até hoje arde e parece que ouço o estalo!

Humilhado, por debique saí destilando contra ela o mesmo repertório de ofensas e preconceitos, pelos quais - infelizmente - ainda agora as louras são discriminadas: que tirando seu corpão de violão era burra, insossa, oxigenada, e tinha QI de minhoca.! Ara, pra quê! Na primeira vez que nos reencontramos, ela soltou-me uma tapa na cara com tamanha força, que a marca dos seus dedos durou vários dias, me obrigando a inventar a mentira de que ao soprar uma luva pra ver se estava furada, ela havia estourado... Mais uma vez, só me resta concordar com meu amigo de fé e filósofo de boteco, Marcão da Lotérica, quando coça a barba e profere outra de suas conhecidas máximas: “Todo homem apaixonado faz papel idiota!”

dilermando cardoso
Enviado por dilermando cardoso em 20/06/2010
Reeditado em 10/03/2011
Código do texto: T2331795