O meu canário

Ele veio assim como tudo na minha vida: um dia apareceu! Não planejei ter um canário. Aliás, para ser bem franca, devo admitir que dentre tantas convicções juvenis, uma delas era ojeriza a gaiolas. Limitar seus vôos.Encarcerar seus sonhos.Uma certa tendência " woodstock" : paz e amor!

O dia em que me presentearam com ele, notei que era muito jovenzinho e arisco me espiava pulando entre os varões da gaiola.A noite fui espiá-lo(acho que pássaros não dormem, buliçosos cantam quando em revoada, bem na entrada da noite vão para seus ninhos.., sempre me questionei - como será que encontram suas casas?) e ele com olhinhos pretos fixos em mim também me olhava e fazia " tique, tique". Está decidido: seu nome será Tique. Durante meses o vi crescer e emplumar-se, jovem e belo com penas amarelo claro(acho que vem daí a expressão amarelo canário).Conseguiu depressa um lugar na minha afeição que lhe levava alpiste, talos de couve, gemas de ovos e rodelas de tomates. Cantava muito. Lindamente.Amorosamente. Todos os dias falo com ele chamando-o pelo nome e sussurrando-lhe palavras de alegria e amizade, relatando sobre meus afazeres e da incompreensão do Fredy, papagaio que me deu uma bicada no braço somente porque não lhe atendi de imediato.Papagaios são temperamentais e ciumentos. Canários são cantadores.

Parafraseando Paulo Mendes Campos ouso dizer que ele nunca deve ter lido Bilac ou Mário Quintana, mas parece tão feliz.Como alguém nunca leu Quintana?! Estabeleceu-se o amor.Eu o amo assim com esse amor vagaroso e distraído com que enquadramos um animalzinho em nossas vidas.Acredito que se ame muito mais um cão viralata, um gato brasino, um pássaro comum do que os animais de raças esmeradas, pedigrees, e com tantas observações no seu trato.Existe com eles um quê de afetação, mas com os bichos comuns o afeto é gratuito, se estabelece de imediato e nos faz bem.

Canta Tique! E o seu lindo canto enche a minha cozinha ensolarada e seus trinados retumbam nas folhas verdes das samanbaias do meu jardim de inverno

Rejane Savegnago
Enviado por Rejane Savegnago em 24/06/2010
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