CAÇADORES DE TARADO

Tem coisa que só acontece em Bom Despacho, e mais nenhum outro lugar deste Brasilzão de meu Deus! Quando em festa de aniversário, reunião na firma, roda de bar, a gente conta qualquer destas estórias que escapam ao cotidiano da vida - mas que aqui são corriqueiras -, logo aparece um ‘estrangeiro’ metido a engraçadinho para gritar truco! E batendo na mesa, riba logo seis. Acaso tenho o menor sestro de mentiroso? A cidade inteira conhece e comenta o caso daquele rico comerciante bom-despachense, que todo final de expediente - fechado o estabelecimento - passava em casa para um banho perfumado, uma jantinha, e depois pegando o carrão na garagem saía pelas ruas a espairecer; ou, como dizem as más línguas, para dar uma voltinha com as namoradas eventuais. Até que em determinada boca da noite, ali pelos quebra-molas da Rua do Rosário, ele resolveu oferecer carona para uma loura fatal - tipo calendário de borracharia! E papo vai, papo vem, um bombomzinho no capricho, chegaram ao trevo da BR-262... região dos motéis! Para não parecer vulgar e nem ser chamado de desmancha prazer, deixo a parte seguinte da estória por conta da imaginação libidinosa dos leitores... Porque o grande problema do galante sedutor foi o regresso. Já no final da subida, pela Rua da Olaria, quando perguntou à beldade onde era sua casa, metamorfoseada em múmia ela simplesmente apontou o dedo esquelético para o rumo do cemitério, logo adiante, na Pracinha do Jardim-sem-flor!

Alguns gaiatos exageram, dizendo que nosso don Juan vespertino, mesmo borrado, saltou do carro em movimento desembestando-se a pé, Rua do Matadouro abaixo; e seu veículo só foi resgatado na manhã seguinte, por um empregado da firma, que não sabia de nada... até entrar no carrão. Pra variar, comigo não houve mulher deste nem do outro mundo, na confusão que com amigos me meti num final de semana, quando nem precisava bafômetro para acusar os ‘birinaites’. Como é de regra nestas ocasiões, dávamos uma ‘melhorada’ escornados entre os canteiros da pracinha do Bairro Santa Ângela, e alguém lembrou o caso do tarado, que após o entardecer vinha atacando mulheres indefesas - naturalmente -, num trecho da antiga Rua da Linha, ali no bairro.

Também, como sendo das primeiras coisas que pinguço fica é valente, outro de nós deu a ideia e ficou decidido que iríamos desmascarar o tarado. Receoso, o Tavinho soltou o cabelão - que lhe descia aos ombros -, e pegando no arame do quintal, escondido, uma saia da sua irmã, ficou ele sendo nossa ‘isca’ para atrair o violentador de damas e donzelas. O tempo passava e nós de tocaia, no escuro, em cima de um barranco. Com a lua apontando no céu, lá veio o monstro. Empurrando o Tavinho - fantasiado de mulher -, para a frente do sacripanta, obstruindo-lhe a passagem, eu e o Zico, de uma vez, como dupla caipira cantando, lançamos o desafio: - Ataca agora, covardão, se for macho! O sujeito, que mais parecia um armário - quase dois metros de altura e pra lá de cem quilos - foi até camarada: - Deixa disso, pessoal, ocês não sabem com quem estão mexendo! - Tá com medo agora, Mariquinha? Foi a última coisa que ouvi o Tavinho falar, imitando voz de mulher. Meus caros leitores, nunca antes, na história desta cidade, três marmanjos bêbados apanharam tanto! Foram pernadas, murros, cotoveladas... Pois o brutamontes que cismamos ser o tarado, para mal dos nossos pecados era lutador de judô, caratê, capoeira, o escambau...Só um mês depois do desastre reunimos condições físicas para sair à rua novamente, e mesmo assim tendo que aguentar os colegas, tirando sarro: - E aí, hoje à noite vai ter lua cheia, topa caçar um tarado na Rua da Linha?

dilermando cardoso
Enviado por dilermando cardoso em 07/07/2010
Reeditado em 14/11/2011
Código do texto: T2363027