A MORTE ANDA DE SKATE

A dor que a mãe do skatista vitimado, em um túnel viário, na cidade do Rio de Janeiro não pode ser mensurada.

Infelizmente e não se tem outro adjetivo, este pobre rapaz encontrou a morte, sobre a prancha de um skate.

A dor, o vazio, a tristeza, o não contar com o sorriso, com o abraço, o não ouvir a voz do filho, o quarto vazio, as roupas, os skates, os rolamentos, as joelheiras, o capacete, os óculos, as camisas de griffe com designe especial a respeito do esporte, agora fazem parte de um todo. Que pode ser traduzido pelo destino comum de todos nós, a morte.

Mas a morte quando violenta e estúpida, choca, machuca e dilacera.

A morte quando natural e normal é aceita de uma forma, mas realista.

No momento todos. Todos sem exceção. Sim todos os meios de comunicação estão estampando manchetes, a respeito do falecimento do pobre rapaz.

Pobre rapaz filho de um artista global, que não tem lá seus predicados artísticos, mas sabe chacoalhar o coqueiro sem derrubar os cocos.

E então todos os jornais televisivos, com os seus célebres chutadores de cachorros mortos, tipo Datena, Afanásio Jasadji e até exploradora de cozinheiras Ana Maria Braga, assumiram o compromisso de demonizar, esculachar, tripudiar, tecer comentários os mais absurdos a respeito dos envolvidos neste trágico acidente, que vitimou este pobre rapaz. Pobre rapaz. Na realidade é uma afronta à pessoa da vítima, ao ter seu nome empregado como forma de massa de manobra, para aumentar a audiência. Tais comentaristas, repórteres e até jornalistas, praticamente já condenaram o causador do acidente. Usam os termos jurídicos doloso, culposo como se fossem doutores no assunto. De fato o são, no divulgar desgraças e mortes. Mas existe um hiato muito grande, entre o que nós ouvintes nos deparamos no dia a dia e o que tais profissionais tentam nos impingir, já com raciocínio formado: Condenar. Isto dá audiência.

Mas e se o contrário ocorresse?

Se um rapaz pobre e não um pobre rapaz fosse vitimado nestas mesmas condições?

Um skate, um túnel interditado, um carro em velocidade, um acidente e uma morte.

Onde reside a diferença?

Simples. No caso primeiro: pobre rapaz é filho de uma artista global e como existe um estado de corporativismo muito grande, o meio midiático tomou as dores, a defesa e passou a viver como que um parto telepático. Julga na mídia. Condena na telinha.

Mais simples ainda. No caso segundo: rapaz pobre é filho de um pedreiro e como não existe um estado de corporativismo estabelecido, não existe meio midiático e ninguém tomou as dores, a defesa e nem participou de um parto telepático. A mídia não julga. A telinha não condena.

É a realidade do dia a dia. Artista da Globo, Record, SBT, Bandeirantes, CNT, Rede Vida, quando se envolve em um acontecimento que vitime uma ou mais pessoas, o sistema corporativista trata de justificar: foi coisa do destino. Não leva em consideração que a dor da família vitimada. Nem tão pouco o estado psicológico da família.

Mas então, quando o assunto é com um dos elementos do mundo artístico e jornalístico, uma romaria sem fim. Mulheres de preto, de óculos pretos, de sapato preto, de calcinha preta, de véu preto, de carro preto, de sombra preta, como tresloucadas carpideiras, que assim se fazem para aparecer mais ainda na telinha ou nas páginas de revistas glamurosas.

Na mesma situação, quando o assunto é com um dos elementos do mundo trabalhador, pedreiro, balconista, vendedor de frutas nas esquinas, catador de lixo, não tem romaria, tem sim um ou dois parentes e amigos. Mulheres sofridas, sandálias de dedo, sendo um pé de cada cor, saias rasgadas, cabelos mal penteados, banguelas e não choram, porque as lágrimas já secaram de tanto chorar pelas perdas dos seus filhos, mortos pela polícia, pelo tráfico de drogas e até por artistas.

No velório de filho de artista, tem até cena deprimente. Marilia Pêra mal conseguia falar. Emocionada? Não. Fortes indícios de ingestão de bebida alcoólica...

Infelizmente a vida é assim.

A morte também anda de skate.

ROMÃO MIRANDA VIDAL
Enviado por ROMÃO MIRANDA VIDAL em 21/07/2010
Código do texto: T2391207